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Josias de Souza

Sem ministério, PR ameaça virar ‘oposicionista’

Josias de Souza

06/02/2012 04h00

Presidente do PR federal, o senador Alfredo Nascimento (AM) reabriu o debate interno sobre as relações do partido com o governo de Dilma Rousseff. Anuncia que a legenda adotará uma posição pública e clara.

O blog procurou Nascimento para saber aonde o PR quer chegar. Por meio da assessoria, o senador mandou dizer: "Ou somos governo ou somos oposição. No meio do caminho não dá mais."

Em agosto de 2011, um mês depois de ser ejetado da poltrona de ministro dos Transportes, Nascimento escalara a tribuna do Senado para anunciar que seu partido abandonara o condomínio governista.

Dissera o seguinte: "No momento em que as condições de respeito e apoio não estão mais presentes na relação com o governo, é porque chegou a hora da independência." A valentia ficou no gogó.

Na prática, a suposta "independência" revelou-se uma pantomima. A grossa maioria dos 44 votos do PR –36 na Câmara e oito no Senado— continuou a serviço dos interesses do Planalto.

A pseudoreforma ministerial de Dilma reacendeu de vez os pendores governistas do PR e a vontade de virar a página da "independência". Para trás. A legenda passou a reivindicar a devolução da pasta dos Transportes.

Ex-segundo de Nascimento, o atual ministro, Paulo Sérgio Passos, é filiado ao PR. Mas o partido não o reconhece como seu representante na Esplanada. Alega tratar-se de uma escolha "pessoal" de Dilma.

Dono de cerca de três minutos de tempo de tevê, o PR passou a ser cobiçado pelo PT, em várias praças, como parceiro para as eleições municipais. O flerte é mais intenso em São Paulo.

Ali, por enquanto, o petismo não logrou atrair para a coligação do candidato Fernando Haddad nenhum partido. Sentindo-se valorizado, o PR condiciona o acerto à retomada da cidadela dos Transportes.

A ideia de Nascimento é concluir a discussão interna sobre os rumos do PR em Brasília ainda em fevereiro. Até aqui, Dilma e seus operadores vêm dando de ombros.

Em privado, Dilma diz que não cogita trocar Paulo Passos pelo nome que o PR empina nos subterrâneos: Luciano Castro (RR). Um deputado que, na contramão da "independência", reteve o título de vice-líder do governo na Câmara.

A cúpula do PR toma a recusa de Dilma como evidência de desapreço. Seus líderes recordam que todos os partidos que perderam ministros sob denúncias de corrupção indicaram o substituto.

Foi assim com o PT de Antonio Palocci, com o PMDB de Wagner Rossi e Pedro Novais, com o PCdoB de Orlando Silva e com o PP de Mário Negromonte. Será assim com o PDT de Carlos Lupi.

Convertido em exceção, o PR declara-se incomodado. Dilma e Cia. parecem descrer que a legenda de Nascimento seja mesmo capaz de transformar o incômodo em oposicionista aberto.

Afora a vocação do PR (ex-PL) para o governismo, surgiu no Congresso uma novidade que atenua os riscos. Chama-se PSD, o partido do prefeito paulistano Gilberto Kassab.

Abrigado sob o guarda-chuva da nova agremiação, um pedaço da oposição, egresso sobretudo do DEM, virou governo. Com uma vantagem.

Kassab oferece os 52 votos de que dispõe na Câmara e os dois do Senado sem exigir de Dilma, até agora, a contrapartida de um ministério. Quer dizer: na improvável hipótese de o PR virar oposicionista em pleno vôo, seus votos talvez não façam tanta falta.

No mais, considerando-se que o Planalto dispõe de outros encanto$ –as verbas das emendas orçamentárias, por exemplo— Nascimento arrisca-se a ficar falando sozinho caso decida esticar a corda.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.