Topo

Josias de Souza

Serra se antecipa ao PT e já negocia com o PSB

Josias de Souza

01/03/2012 04h01

Menos de 24 horas depois de ter formalizado a inscrição nas prévias do PSDB, José Serra iniciou a costura de sua coligação partidária. Inaugurou a negociação pelo PSB, partido presidido nacionalmente pelo governador pernambucano Eduardo Campos, amigo e aliado tradicional de Lula.

O candidato tucano antecipa-se ao PT, que dá de barato que Eduardo Campos irá empurrar o PSB de São Paulo para o colo petista de Fernando Haddad. Alheio às certezas do petismo, Serra reuniu-se nesta quarta-feira (29) com o presidente do diretório paulistano do PSB, o vereador Eliseu Gabriel de Pieri.

O encontro foi ajeitado pelo prefeito Gilberto Kassab (PSD), parceiro político de Eduardo Campos e aliado de Serra. Terminada a conversa, Serra tocou o telefone para o presidente do PSB no Estado de São Paulo. Chama-se Márcio França. É o atual secretário de Turismo do governo tucano de Geraldo Alckmin.

Serra disse a Márcio que acabara se acertar com Eliseu, o mandachuva do PSB municipal. Deu a entender que, uma vez referendado pela direção estadual do PSB, o acordo estaria praticamente fechado. Do ponto de vista formal, é verdade. Na prática, não é tão simples.

oOo

Embora simpático à coligação com o tucanato, Márcio condiciona a decisão à vontade de Eduardo Campos. Fará o que o líder nacional da legenda quiser. Vai tomar a pulsação do governador de Pernambuco no domingo (4), quando se reunirá com ele para conversar sobre a encrenca de São Paulo.

Dono de taxas de aprovação que roçam os 80%, Eduardo Campos cultiva um projeto nacional. Seu mandato de governador termina em 2014. Se as condições políticas permitirem, quer se candidatar à Presidência. Se Dilma Rousseff estiver bem posta nas pesquisas, quer ser o candidato a vice na chapa oficial.

As ambições do mandarim pernambucano contrastam com o nanismo do seu partido. Com boa presença no Nordeste, a legenda é débil em regiões estratégicas como o Sudeste. Numa tentativa de remediar suas debilidades, Eduardo Campos firmou com Gilberto Kassab uma parceria estratégica.

Ajudou o prefeito paulistano, egresso do DEM, a pôr em pé o PSD. Aproximou-o do governo federal. Hoje, o PSD de Kassab faz dobradinha no Congresso com o PSB de Eduardo. Juntos, dispõe de uma bancada capaz de fazer sombra no Legislativo ao PMDB do vice Michel Temer.

oOo

Eduardo Campos enxerga em Kassab, com quem se reuniu no sábado de Carnaval, uma espécie de porta de entrada em São Paulo, o maior colégio eleitoral do país. Para não acomodar os dois pés numa única canoa, achegou-se a Geraldo Alckmin. Endossou a nomeação de Márcio França, um deputado federal do PSB, para a secretaria de Turismo do governo tucano.

No final do ano passado, os dois governadores reuniram-se num café da manhã. Eduardo Campos foi a Alckmin para pedir-lhe que ajudasse a eleger sua mãe, a ex-deputada Ana Arraes (PSB-PE), para uma cadeira de ministra do TCU. Alckmin providenciou para que os deputados paulistas do PSDB votassem em Ana.

Nessa conversa, testemunhada por Márcio França e pelo chefe da Casa Civil de São Paulo, Sidney Beraldo, Eduardo e Alckmin trocaram ideias sobre as eleições municipais de 2012. O governador pernambucano pediu a Alckmin que apoiasse o candidato do PSB à prefeitura de Campinas, Jonas Donizette.

Sem problemas, Alckmin respondeu. Em seguida, perguntou a Eduardo Campos se o PSDB poderia contar com o PSB na cidade de São Paulo. Eis o que respondeu o colega de Pernambuco segundo uma das testemunhas do diálogo: Na capital tudo bem, nós não temos candidato. Não vejo dificuldade em apoiar nenhum nome, exceto se for o Serra.

oOo

Àquela altura, Serra era um não-candidato. Nem Alckmin parecia desejar a candidatura dele. Hoje, com os ventos soprando noutra direção, Eduardo Campos terá de decidir manter o veto a Serra e agradar Lula ou permitir o apoio do PSB ao tucano, fragilizando o principal projeto eleitoral do PT para 2012.

Na primeira hipótese, Eduardo mantém vivo seu projeto de desbancar Temer na vice da chapa de Dilma para 2014. Na segunda, potencializa a parceria com Kassab, vitamina Serra e aposta no fortalecimento do PSB num Estado em que as negociações com Alckmin foram além do prometido.

Afora a aliança do PSDB com o candidato do PSB em Campinas, Alckmin cuidou de associar o tucanato à legenda de Eduardo Campos noutras praças. Por exemplo: o PSDB apoia a candidatura à releição do prefeito de São José do Rio Preto, Valdomiro Lopes, do PSB.

Outro exemplo: com as bênçãos de Alckmin, o PSDB dá suporte a Caio França, também do PSB. Filho do secretário Márcio França, ele concorre à prefeitura do município de São Vicente.

O eventual apoio de Eduardo Campos ao petista Fernando Haddad, além de comprometer esses acordos, levaria à inevitável saída de Márcio França da secretaria de Turismo. Eis o dilema do mandachuva do PSB: atender Lula e fortalecer o PT ou aliar-se à dupla Serra-Kassab e tonificar a si próprio.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.