Após concordar em tirar da Lei da Copa a venda de bebida em jogos, governo quer dar meia volta
Trapalhadas e o medo de novas derrotas levaram o Planalto a sustar a pauta de votações da Câmara. Com os partidos de sua coalizão em completo desalinho, Dilma pediu aos seus operadores políticos que postergassem as votações de duas propostas: o Código Florestal e a Lei Geral da Copa.
Para complicar, as ministras Idelli Salvatti (Coordenação Política) e Gleisi Hoffmann (Casa Civil) protagonizaram um roteiro de trapalhadas que adicionou eletricidade num ambiente já próximo do curto-circuito. Tudo isso no dia seguinte à troca dos líderes do governo nas duas Casas do Legislativo.
Ideli encontrou-se com representantes das legendas governistas. A certa altura, encaminhou a conversa para a pauta de votações. Começou pela Lei da Copa, que imaginava mais arredondada. Lero vai, lero vem chegou-se ao enrosco: a liberação da venda de bebidas alcoólicas nos estádios.
Trata-se de exigência da Fifa. A entidade mantém contrato de patrocínio com uma grande cervejaria. Um assessor da Casa Civil, que acompanhava Ideli, disse aos líderes que o governo não havia assumido nenhum compromisso com a entidade futebolística. Os deputados fizeram cara de espanto.
O bloco governista concordara em injetar a cerveja no texto por acreditar que o Planalto desejava servi-la à Fifa. Companheiro de partido de Ideli, o relator do projeto, Vicente Cândido (PT-SP), só faltou subir pelas paredes. E os líderes, um por um: já que o governo não faz questão, retire-se a bebida do texto.
Temendo pelo pior, Arlindo Chinaglia (PT-SP), o novo líder de Dilma na Câmara, tocou o telefone para a Casa Civil. Perguntou a Gleisi Hoffmann se era verdade que a bebida nos estádios não compõe o rol de compromissos assumidos com a Fifa.
Pendurado ao celular, Arlindo ia reproduzindo para os líderes, em voz alta, as respostas que ouvia de Gleisi. Sim, era aquilo mesmo. A bebida nos jogos é bandeira da Fifa, não do governo. Acertou-se, então, que o relator retiraria a encrenca do texto, facilitando a aprovação.
Escaldado, um dos líderes telefonou para o ministro Aldo Rebelo (Esportes). Contou-lhe o que sucedera. E Aldo desdisse Ideli, Gleisi e o assessor palaciano. Contou que o governo assumiu, sim, o tal compromisso com a Fifa. Recordou que ele próprio havia tratado do tema com Ideli.
À noite, quando já estava claro que o governo tropeçava nas palavras como um bêbado no meio-fio, Aldo foi ao Planalto. Conversou com Ideli e Gleisi. Depois, levou à web uma nota oficial. Diz o texto:
"O governo federal esclarece que o compromisso assumido junto à Fifa relativo à venda de alimentos e bebidas nos estádios e outros locais durante a Copa do Mundo consta do projeto de lei originalmente encaminhado ao Congresso, em seus artigos 34 e 43, os quais foram mantidos no texto do relator…"
O artigo 43 revoga trecho do Estatuto do Torcedor que proíbe a venda de bebidas nos estádios. Aprovando-o, os deputados estariam liberando a cerveja. O governo agora vai tentar convencer seus aliados a recuar do recuo. "Na minha opinião, a bebida já era", diz um dos líderes que testemunharam a trapalhada.
No caso do projeto que reformula o Código Florestal, Dilma e sua equipe encontram-se numa espécie de mato sem cahorro. Aprovou-se no Senado um texto que o Planalto considera ideal. A presidente quer vê-lo ratificado na Câmara.
O diabo é que, sob influência da bancada ruralista, formou-se entre os deputados uma maioria suprapartidária contra a versão do Senado. A Câmara quer endireitar o Código (com trocadilho, por favor).
Ideli disse aos líderes que Dilma não gostaria de ser surpreendida. Em privado, afirma que ela prefere não votar a ser derrotada. Receia passar vexame na conferência Rio+20, marcada para junho.
Ideli não sabia, mas o líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves RN), reunira-se mais cedo com lideranças de outras 13 legendas. Advogando a causa do Planalto, sugerira que a votação do Código ficasse para junho, depois da Rio+20. Nada feito, responderam 100% dos líderes. Em vez de protelar, querem apressar a votação.
Deu-se a Arlindo Chinaglia o prazo de alguns dias para inteirar-se do assunto. Na semana que vem, a maioria rural quer votar. Nem um apelo de Jesus Cristo conseguiria adiar essa votação, disse Henriqiue Alves a um amigo. Estima-se que, se não negociar, Dilma será derrotada por mais de 400 dos 513 deputados.
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