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Josias de Souza

SUS do B: sem pagar nada, senadores usufrem de um sistema de saúde verdadeiramente único

Josias de Souza

25/03/2012 05h20

Há seis dias, José Sarney presidiu no Senado uma cerimônia de celebração à Campanha da Fraternidade da CNBB, batizada neste ano de 'Fraternidade e Saúde Pública'. Ao discursar, Sarney lamentou que os patrícios ainda tenham de lidar com um serviço de saúde doente.

"A Campanha da Fraternidade tem razão quando diz que o SUS ainda não conseguiu ser implantado em sua totalidade e ainda não atende a contento, sobretudo os mais necessitados desse serviço. Infelizmente, nós lidamos com a ausência de recursos e os investimentos não acontecem na escala necessária."

O lamento de Sarney não vale para o Senado, a Casa que preside pela quarta vez. Ali, funciona uma espécie de 'SUS do B', um sistema de saúde verdadeiramente único e universal. Oferece todos os privilégios e regalias que o dinheiro do contribuinte pode pagar. No Brasil e no exterior.

O repórter Chico de Gois leva às páginas notícia sobre esse SUS dos sonhos. Sem desembolsar um mísero centavo, os senadores e seus dependentes dispõem de assistência médica pelo resto da vida. Não há carências nem limite de gastos. Basta apresentar a nota. Vale tudo, inclusive conta de dentista.

Há casos em que os reembolsos ultrapassam a casa dos R$ 100 mil anuais. Desde 2007, os ressarcimentos sorveram das arcas do Tesouro R$ 17,9 milhões. Incluindo-se os ex-senadores, a conta é engordada em R$ 72, bilhões. Salta, então, para R$ 25,1 milhões.

Sim, acredite, o seu dinheiro custeia também as consultas e os exames dos ex-senadores. Para desfrutar do "direito" de desafiar a paciência alheia, os pacientes do Senado nem precisam passar pelo inconveniente das urnas. Um suplente sem votos escala o Éden depois de exercer o mandato por escassos seis meses.

Para os ex-senadores, o 'SUS do B' impõe um teto de despesas: generosos R$ 32.958,12. Mas esse limite é frequentemente ultrapassado. Em 2008, o ex-senador Moisés Abrão Neto (PDC-TO) espetou na bolsa da Viúva despesas médicas de R$ 109.267.

No ano anterior, 2007, o ex-senador Divaldo Suruagy (PMDB-AL), fora do Senado desde 1994, teve ressarcida uma conta do dentista: R$ 41.500. De volta a 2008, contribuinte pagou R$ 67 mil pelo tratamento dentário da mulher do ex-senador Levy Dias (DEM-MS).

Há casos que, por inexplicáveis, dispensam explicações. Certos ex-senadores apresentam faturas médicas que coincidem com o teto de R$ 32,958,12. Valor exato, cravado até nos centavos. Foi o que sucedeu com pelo menos três ex-senadores: Lúdio Coelho (2009); Levy Dias, de novo ele (2010); Carlos Magno Barcelar (2011); e Antonio Lomanto Júnior (2011).

Afora os ressarcimentos de tratamentos privados, os senadores dispõem, no prédio do Senado, de um posto de saúde. Coisa fina, indisponível em muitos municípios brasileiros. Tratados assim, terão vida longa –os senadores, os 'ex', e a conta imposta aos contribuintes em dia com o fisco.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.