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Josias de Souza

Elio Gaspari:O medo de uma CPI da 'tia do PAC'

Josias de Souza

18/04/2012 06h06

Mal mergulhara na CPI do Cachoeira, o petismo se deu conta de que colocara para andar uma iniciativa de dois gumes. Na ânsia de jantar os ossos da oposição, levara à mesa um banquete que incluía a Delta e todo o etcétera que vem junto com ela. Em seu artigo desta quarta (18), o repórter Elio Gaspari traz, mastigados, os riscos. Disponível aqui, em plataforma aberta, o texto vai reproduzido abaixo:

Materializou-se um pesadelo do comissariado petista. Foi ao ar o grampo em que o empresário Fernando Cavendish, dono da empreiteira, Delta diz que 'se eu botar 30 milhões [de reais] na mão de um político, eu sou convidado para coisa para c….. Pode ter certeza disso, te garanto'.

A versão impressa dessa conversa surgiu em maio passado, numa reportagem da revista 'Veja'. Ela descrevia uma briga de empresários, na qual dois deles, sócios da Sygma Engenharia, desentenderam-se com Cavendish e acusavam-no de ter contratado os serviços da JD Consultoria, do ex-ministro José Dirceu, para aproximar-se do poder petista. A conta foi de R$ 20 mil.

À época, o senador Demóstenes Torres, hoje documentadamente vinculado a Carlinhos Cachoeira, informou que proporia uma ação conjunta da oposição para ouvir os três empreiteiros. Deu em nada, como em nada deram inúmeras iniciativas semelhantes. Se houve o dedo de Cachoeira na denúncia dos empresários, não se sabe.

Diante do áudio, a Delta diz que tudo não passou de uma 'bravata' de Cavendish. O doutor, contudo, mostrou que sabe se relacionar com o poder. Tem 22 mil funcionários e negócios com obras e serviços públicos em 23 Estados e na capital.

No Rio de Janeiro, participa do consórcio da reforma do Maracanã. Seu diretor regional de Goiás era interlocutor frequente de Carlinhos Cachoeira. Na última eleição, Cavendish botou R$ 1,1 milhão no cofre do Comitê Nacional do PT e R$ 1,1 milhão no PMDB. Em ambos os casos as doações foram legais.

Em apenas 15 meses, durante o segundo mandato de Sérgio Cabral, de quem Cavendish é amigo pessoal, a Delta conseguiu contratos no valor de R$ 1,49 bilhão, R$ 148 milhões sem licitações. Suas contas com o PAC chegam a R$ 3,6 bilhões.

Talvez o comissariado petista pensasse que o grampo de 2009 seria sepultado. Seu erro foi, e continua sendo, acreditar que pode empurrar esse tipo de conta para mais tarde. Se o comissário Ruy Falcão acreditou que a CPI em torno das atividades de Carlinhos Cachoeira exporia a 'farsa do mensalão' (rótulo criado por Lula), enganou-se.

O PT tem um encontro marcado com as malfeitorias de seu comissariado. Desde 2004, quando apareceu o primeiro grampo de Cachoeira, no qual ele corrompia um servidor que se tornaria subchefe da Casa Civil, a questão é simples: corta na carne ou continua a contaminar o organismo.

O que o comissariado vem fazendo é mostrar-se poderoso o suficiente para dobrar as apostas. Tamanha é sua onipotência que há nele quem creia ser possível contaminar ministros do Supremo Tribunal Federal.

Luiz Marinho, prefeito de São Bernardo e ex-ministro de Lula, condena a possibilidade de o ministro José Dias Toffoli vir a se declarar impedido de julgar o mensalão, mesmo tendo sido assessor do PT, da Casa Civil de José Dirceu e advogado-geral da União de Lula. Nas suas palavras: 'Ele não tem esse direito'. (O ministro Ricardo Lewandowski, em cuja mesa está o processo do mensalão, pertence a uma próspera família de São Bernardo, em cuja Faculdade de Direito diplomou-se.)

Passaram-se sete anos do surgimento da palavra 'mensalão' e o PT continua adiando a hora da faxina. Na semana passada, os comissários flertaram com a ideia da criação de uma CPI que supunham letal para a oposição. Em poucos dias, descobriram que estavam enganados."

– Ilustração via Miran Cartum.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.