Há uma fenda na ‘blindagem’ de Gurgel no STF
Na noite de quinta-feira, um ministro do STF discorreu sobre a encrenca que Roberto Gurgel criou para si mesmo ao "sobrestar" por três anos o inquérito da Operação Vegas. Falou a três amigos ao redor de uma garrafa de chianti.
Quem ouviu a toga ficou sabendo que a 'blindagem' oferecida ao procurador-geral no Supremo não é unânime. A voz do chianti acha que falta ossatura técnica às explicações oferecidas por Gugel numa nota e numa entrevista.
Por escrito, alegou-se que o inquérito desceu à gaveta por "estratégia". Nessa versão, como os indícios contra Demóstenes Torres eram fracos. Desejou-se "evitar que fossem reveladas outras investigações". O problema, disse o ministro, é que outras investigações não havia àquela altura. Nem foram demandadas.
No gogó, Gurgel identificou seus críticos como gente que está "morrendo de medo do julgamento do mensalão." Referiu-se à tática de levá-lo ao banco da CPI como "tentativa de imobilizar o procurador-geral da República."
Nessa frente, disse Gurgel, tenta-se impedir o chefe do Ministério Público de "atuar, seja no caso do senador Demóstenes, seja preparando-se para o processo do mensalão, caso que classifiquei como talvez o mais grave atentado à democracia brasileira."
Que o mensalão é grave, não há dúvida, concordou o ministro. Que há gente desesperada com a proximidade do julgamento, ninguém descrê. Mas nada disso explica o fato de um inquérito ter permanecido no limbo da Procuradoria sem um despacho que o enviasse ao arquivo ou lhe desse um novo rumo.
Taça vai, taça vem o ministro do chianti declarou que o caso ganhou contornos de esquisitice depois do depoimento do delegado federal Raul Alexandre Marques de Souza. Condutor do inquérito Vegas, o delegado injetou na encrenca a subprocuradora-geral Cláudia Sampaio Marques.
Mulher de Gurgel, foi Cláudia quem informou ao delegado Raul que a Procuradoria não identificara nos autos elementos que justificassem o envio ao Supremo. Até aí, disse o ministro, tudo bem.
Na avaliação da toga, o que torna a fala do delegado inquietante é o pedaço em que ele conta que nem a doutora nem o marido dela formalizaram a decisão paralisante nas páginas do processo.
Inquietam mais ainda os desdobramentos. O delegado não foi desmentido. E a ausência de uma manifestação formal da Procuradoria no corpo do inquérito permanece pendente de explicação. O ministro se pergunta: como seria possível aguardar por investigações complementares se elas não foram requisitadas?
O ministro disse aos seis pares de orelhas que acompanhavam seu raciocínio que Gurgel e Cláudia desfrutam do mais alto conceito. No Supremo, não há quem não admire a dupla pela densidade jurídica e capacidade funcional.
Acha que, até em respeito à própria biografia, Gurgel deveria se reposicionar em cena. Considera absurda a idéia de expor o procurador-geral sob os holofotes de uma CPI. Mas considera igualmente insensata a ausência de explicações capazes de ficar em pé.
Com sua tática, finalizou a voz do chianti, Gurgel joga água no moinho da defesa de Demóstenes Torres, que tenta derrubar, por supostamente ilegais, os grampos que fisgaram o senador. Vai ficando claro, declarou o ministro, que a PF ouviu o senador sem autorização do STF com receio de que a Procuradoria matasse a segunda Operação deflagrada contra a quadrilha de Cachoeira, a Monte Carlo.
Pior: para constranger Gurgel, acredita o ministro, a PF cuidou afrontar a lei vazando os grampos sigilosos das duas operações. Com os drenos, criou-se um fato consumado que arrancou o procurador-geral de sua inação. Como se vê, há uma fenda no escudo oferecido a Gurgel pelo STF.
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