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Josias de Souza

Na eleição de Recife, o maior rival do PT é o PT

Josias de Souza

05/06/2012 21h16

O PT confirmou nesta terça (5) que seu candidato à prefeitura de Recife será mesmo o senador Humberto Costa. Chegou-se ao nome após intenso diálogo. Um diálogo travado entre cegos e surdos, no tapetão do impasse.

Para impor Humberto, o PT retirou da disputa, na marra, João da Costa. Atual prefeito da capital pernambucana, o companheiro viu-se privado de um direito que supunha natural. O direito de disputar a reeleição.

Sob o pretexto de que a impopularidade faz do prefeito um candidato perneta, o PT cortou-lhe o pescoço. E terminou produzindo uma alternativa sem pé nem cabeça. Uma saída que confunde o eleitor, ajuda a oposição é joga o PT contra o PT.

Antes do desastre, realizara-se uma prévia. João da Costa foi à sorte dos votos contra o deputado Maurício Rands. Houve guerra de liminares judiciais. A turma de Rands acusou a banda de João de engordar o colegiado com militantes que não teriam direito a voto.

Se quisesse ser levado a sério, Rands poderia ter se recusado a participar das prévias. Preferiu disputar. Ao fazê-lo, legitimou os votos que tachava de ilegítimos. Abertas as urnas, perdeu. Depois do jogo jogado, o PT federal interveio. Anulou o resultado e marcou uma segunda disputa.

Súbito, antes que o tira-teima pudesse se realizar, Rands retirou-se de campo. Pela lógica, João da Costa viraria candidato por WO. Porém, na mesma entrevista em que informou sobre sua desistência forçada, Rands esclareceu que o candidato seria Humberto. Sem prévias.

O PT informa ao eleitorado que João da Costa, o prefeito do PT, é um administrador precário. Tão precário que não merece a reeleição. Com isso, o partido organiza o discurso da oposição. Por que devolver a prefeitura a um partido que não confia em si mesmo?

De resto, o PT fez de um bom quadro, Humberto Costa, um candidato temerário. Que terá como principais antagonistas a má vontade de João da Costa e a resistência da máquina da prefeitura do PT.

Deve-se toda essa engenharia a Lula. Ao chegar para o encontro que levou seu escalpo à bandeja, João da Costa foi abordado por Rui Falcão. O presidente do PT federal informado ao prefeito a cabeça dele já não se equilibrava sobre o pescoço. Humberto Costa era fato consumado.

"Diante disso, achamos que não fazia sentido continuar na reunião", disse João da Costa ao retirar-se do cadafalso. Segundo ele, Falcão lhe disse que a opção por Humberto era um mimo de Lula ao governador pernambucano Eduardo Campos.

Em troca, o PSB de São Paulo, rendido ao comando de Eduardo, será empurrado, meio a contragosto, para dentro da coligação de Fernando Haddad, o candidato de Lula à prefeitura paulistana. Perguntou-se a João se vai apoiar Humberto. E o prefeito: "Pode ser que ele nem queira meu apoio."

O mal dos partidos políticos é que têm excesso de cabeças e carência de miolos. Com Lula, o PT exibe a mesma debilidade. A diferença é que opera com uma cabeça só.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.