Datafolha informa que Serra vive a crise dos 30
Para o paulistano, José Serra é um livro aberto. Praticamente 100% dos eleitores da cidade de São Paulo declaram conhecê-lo. Natural. Já foi lido e relido em quase todos os capítulos que um político pode escrever. Sua biografia mistura Legislativo e Executivo. A Câmara, o Senado, dois ministérios, a prefeitura, o governo do Estado.
Recém-saído da vitrine presidencial, Serra encontra-se mergulhado em sua oitiva eleição majoritária. Cavalga um partido cuja hegemonia estadual está na bica de completar aniversário de 20 anos. Com tudo isso, Serra frequenta as últimas quatro sondagens do Datafolha em posição paradoxal.
Serra lidera as pesquisas. Mas não encontra nas planilhas nenhuma razão para comemorarações. Estacionou na casa dos 30%. Para quem já foi quase tudo, é pouco, muito pouco, pouquíssimo. É como se o eleitor, conhecendo-o de cabo a rabo, gritasse para o candidato tucano: 'A mim é que você não engana'.
Em março, pouco depois prevalecer nas prévias do PSDB, Serra escalara o octógono com cara de Anderson Silva. Deu uma voadora de nove pontos. Dos 21% que o Datafolha lhe atribuíra dois meses antes, saltou para a casa dos 30%. Submetido a adversários com pouca visibilidade e nenhuma passagem por cargos executivos, parecia diante de uma briga fácil.
Desde então, foram às manchetes três pesquisas do Datafolha. Em 17 de junho, Serra cravou os mesmos 30%. Em 27 de junho, a três dias da convenção que o confirmaria como candidato, amealhou 31%. Nesta quinta (19) e na sexta-feira (20), os pesquisadores do instituto voltaram ao meio fio. Na nova sondagem, a primeira depois da temporada de composições de chapas e coligações, Serra aparece, de novo, com 30%.
Serra virou, por assim dizer, uma notícia velha, jornal de ontem. No retrato momentâneo esboçado pelos dados do Datafolha, a novidade é Celso Russomano. Em janeiro, quando Serra tinha 21%, Russomano somava 17%. Foi a 19% em março, amealhou 21% e 24% nas duas rodadas de junho e cravou 26% agora. Quer dizer: estacionado, Serra enxerga o azarão Russomano avançar sobre o seu retrovisor.
Quem conhece de eleições sabe que o jogo de São Paulo está longe de ser jogado. Os principais lances da partida virão junto com a propaganda eletrônica no rádio e, sobretudo, na tevê. Ao volante de um inexpressivo PRB e de uma coligação esquálida com o PTB, Russomano terá de fazer milagre para manter a aparência de candidato competitivo com seus 2 minutos de tevê. Mas está claro que os rivais e a imprensa já não podem ignorá-lo.
Na rabeira do Datafolha, roçando parachoques, embolam-se Fernando Haddad (PT), Soninha Francine (PPS), Gabriel Chalita (PMDB) e Paulinho da Força Sindical (PDT), empatados e empacados num intervalo que varia dos 5% aos 7%. Entre todos, os menos conhecidos são Haddad e Chalita.
O primeiro dispõe de padrinho (Lula), partido e bom tempo de tevê (8 minutos). O outro tem boa lábia, máquina partidária e vitrine eletrônica que, se não é comparável à dos principais antagonistas, tampouco é negligenciável (4min30s). Portanto, seria temerário tratar Haddad e Chalita como cartas fora do baralho.
Assim, considerando-se os números colecionados até aqui pelo Datafolha, esboça-se em São Paulo uma eleição de dois turnos. Serra ainda reúne as condições mínimas para passar ao segundo round. Mas não se revelou, por ora, o favorito que supunha ser. Ao contrário. Potencializa-se a impressão de que Serra tornou-se o candidato mais bem cotado para fazer do rival que disputar com ele o turno final o próximo prefeito de São Paulo.
Serra vive a crise dos 30. Para superá-la, terá de convencer o paulistano de que deseja ardentemente colocar sua experiência a serviço de um município que já governou. Para alguém que rasgou o compromisso de exercer o mandato de prefeito até o fim e sonha diuturnamente com o Planalto, não é tarefa simples. A renitência dos 30% insinua que o eleitor quer virar a página. Para a frente, não para trás. Entre o livro aberto e as incógnitas, o dono do voto flerta com a enganação nova.
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