Para Bastos, processo do mensalão é ‘artificial’
Como ministro da Justiça de Lula, Márcio Thomaz Bastos chefiou a Polícia Federal que investigou o mensalão. Como advogado, dedica-se a desqualificar as provas que, sob seu comando, o braço policial do governo alega ter reunido contra um dos 38 réus: José Roberto Salgado, executivo da Banco Rural.
Na pele de defensor de Salgado, o doutor sustenta que a PF falhou na colheita de provas e a Procuradoria-Geral da República exorbitou na denúncia: "Não estão provados os delitos que imputam, nem a materialidade", disse Tohmaz Bastos em entrevista ao repórter Fausto Macedo.
Afora a alegada inconsistência material, o processo que corre no STF seria, no dizer de Thomaz Bastos, "artificial". Por quê? "Essa causa é uma confederação de condutas. São muitos os processos que foram anexados um ao outro e se tornaram um só. É artificial a junção de todas as condutas, de todos esses fatos."
Para ele, como não dispõe de mandato eletivo, Salgado deveria ser julgado na primeira instância do Judiciário, não no Supremo, foro dos congressistas. Thomaz Bastos já requereu o desmembramento dos autos. Relator do processo, o ministro Joaquim Barbosa indeferiu o pedido.
"Em questão de ordem, vou levar a demanda [do desmembramento do processo] para o plenário do Supremo com foco na Constituição", anuncia o defensor do executivo do Rural. Deve-se a insistência a um detalhe crucial.
Se for condenado no Supremo, o cliente de Thomaz Bastos não terá a quem recorrer. Enviado a um juiz de primeiro grau, o processo recomeçaria, por assim dizer, do zero. E as possibilidades de recurso iriam a um infinito que fatalmente levaria à preecrição dos crimes financeiros e de peculato imputados a Salgado.
A chance de Thomaz Bastos ser atendido é mínima. Dos 38 réus do mensalão, apenas dois dispõem de mandato. Quer dizer: atendendo a Salgado, o Supremo teria de remeter ao primeiro grau outros 35 acusados. Algo que, a essa altura, soaria como um despautério. Disponível aqui, vai abaixo o miolo da entrevista do ex-ministro:
— O que há de diferente na demanda? Essa causa é uma confederação de condutas. São muitos os processos que foram anexados um ao outro e se tornaram um só. É artificial a junção de todas as condutas, de todos esses fatos.
— O dinheiro do mensalão era destinado a campanhas do PT? O mensalão foi caixa dois eleitoral? Eu não tenho o que dizer a respeito. Eu não tenho nenhuma relação com isso. Meu cliente não é acusado de peculato, é acusado de descumprimento de normas do Banco Central. Normas que ele cumpriu.
— A procuradoria pôs seu cliente no 'núcleo financeiro' do mensalão. Não estão provados os delitos que imputam [a Salgado], nem a materialidade. Os empréstimos para o PT, para a SMP&B e para a Grafitte ocorreram em 2003. [Salgado] tornou-se diretor vice-presidente [do Rural] em abril de 2004. Não teve nenhuma participação nos empréstimos. É na concessão que está o risco. Ele não autorizou empréstimos. Não praticou corrupção, peculato, compra de votos.
— Salgado é acusado por quadrilha. Como quadrilha, se nem conhece as pessoas [os outros réus]? Em 2003, ele era diretor da área de câmbio e internacional do Rural. Não tinha nenhum contato com essa área [de crédito]. Ele é um homem machucado. São sete anos de processo. Um homem honrado, com medo de sair na rua.
— Vai pedir separação do processo? O relator [Joaquim Barbosa] indeferiu [a desconexão]. Entrei com agravo, mas ele negou seguimento. Em questão de ordem, vou levar a demanda para o plenário do Supremo com foco na Constituição. Estou argumentando questão de nobreza constitucional. O Supremo não pode julgar quem não tem direito a foro especial. Veja o mensalão mineiro [que envolve o deputado Eduardo Azeredo, do PSDB]. Foi cindido em três ações penais, duas no STF, uma em Minas. É a jurisprudência do Supremo.
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