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Josias de Souza

Agonia do STF reacende divisão interna do PT

Josias de Souza

14/10/2012 06h52

Ao condenar por corrupção ativa José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares, o STF riscou um fósforo que reacendeu o pavio da divisão interna do PT. Ressurgiram na legenda as críticas à hegemonia exercida pelo diretório de São Paulo. Em privado, um petista gaúcho resumiu a cena: o PT que o Supremo Tribunal Federal acaba de condenar é o PT paulista, com seus métodos e seus vícios.

Lideranças petistas de outros Estados movem-se em segredo para tentar converter as queixas fragmentadas num movimento orgânico. Em 2005, quando foi deslocado do Ministério da Educação para a presidência de um PT em chamas, Tarso Genro, hoje governador do Rio Grande do Sul, falava em "refundação" do PT. Agora, utilizam-se vocábulos menos drásticos: renovação e oxigenação, por exemplo.

Deixando-se de lado o ajuste de linguagem, a causa da ebulição é essencialmente a mesma: a supremacia exercida no aparelho partidário pelo antigo Campo Majoritário, rebatizado de 'Construindo um Novo Brasil'. Uma corrente que, personificada em José Dirceu, é vista pelos críticos como responsável por dois movimentos ruinosos.

Num, dizimaram-se os grupos que davam ao PT a aparência de um partido vivo. Noutro, a pretexto de construir a política de alianças que pavimentou a primeira eleição de Lula, empurrou-se a legenda para um modelo que, na visão dos descontentes, desaguou no mensalão. Os "renovadores" enxergam no ocaso de Dirceu um horizonte favorável à desobstrução do debate.

Como que farejando o cheiro de queimado, Lula leva o pé à porta. Tenha o nome que tiver –refundação, renovação ou oxigenação— a mudança de hábitos internos teria de passar por uma autocrítica que o morubixaba do PT não parece disposto a fazer. Na prática, significaria reconhecer que sua passagem pela Presidência desfigurou o PT.

Tomado pelo que disse nos últimos dias, Lula prefere virar a página do mensalão para trás. Realiza-se no STF, segundo ele, um julgamento político. Passado o segundo turno, pretende dizer que Dirceu e Genoíno foram condenados injustamente, sem provas. E ponto.

Represadas pela disputa eleitoral, as críticas que reabrem as trincas do PT tendem a crescer na proporção direta da aproximação do ano de 2013, quando o partido terá de renovar sua direção. Os petistas mais próximos de Lula acreditam que ele defenderá a recondução de Rui Falcão à presidência da legenda. O mesmo Rui Falcão que se refere ao mensalão como "uma farsa".

Como não há no PT nenhuma voz capaz de se contrapor à de Lula, a almejada renovação passa pelo convencimento dele. E Lula não demonstra, por ora, a menor vontade de ser convencido. Se prevalecer na disputa de São Paulo com Fernando Haddad, sua vontade será ainda menor. Mantido o quadro, diz um dos insatisfeitos, o PT perderá uma ótima oportunidade para "se reinventar".

Nessa versão, o partido passaria a operar com horizontes "curtos". Bem posto para a disputa presidencial de 2014, com Dilma Rousseff, viraria na sequência uma "terra de ninguém". Faltam-lhe nomes. Algo que, mesmo considerando-se a debilidade da oposição, abre o caminho para que um personagem como Eduardo Campos (PSB), um quase-ex-aliado, se consolide como alternativa de poder.

Os defensores da renovação realçam que, sob Lula, os nomes que ele próprio considerava como opções presidenciais –José Dirceu e Antonio Palocci— foram dissolvidos em escândalos, forçando-o a "fabricar" Dilma. Agora, enxerga-se na fixação de Lula pelo novato Haddad um reconhecimento não declarado à inevitabilidade da busca de alternativas. Daí a pregação em favor da 'despaulistização' do comando partidário.

Uma das vozes pró-renovação raciocina: se não estivesse rendido aos caprichos do grupo de São Paulo, o PT talvez tivesse facultado ao Jaques Wagner [governador da Bahia] ultrapassar a condição de mero líder estadual. Talvez não enxergasse o Tarso Genro como eterno presidenciável de si mesmo. Talvez não deixasse o senador Lindbergh Farias falando sozinho sobre a construção de uma candidatura ao governo do Rio. Talvez…

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.