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Josias de Souza

Fixação de penas do mensalão entra pelo mês de novembro e prisões podem ficar para 2013

Josias de Souza

25/10/2012 04h07

Vencida a fase do julgamento em fatias, o STF adotou como método de definição da dosagem das penas o ritmo de conta-gotas. Em três dias, os ministros só conseguiram fechar a conta de um dos 25 condenados: Marcos Valério. Foi para o beleléu o plano de concluir a análise do processo nesta semana.

Em conversa com o blog, um dos ministros do Supremo previu que a 'dosimetria' pode não ser concluída antes de meados de novembro. Depois, disse o magistrado, a decisão terá de ser publicada. Normalmente, um acórdão leva até 15 dias para ser impresso. Estima-se que, na sequência, vários réus protocolarão 'embargos'.

Receia-se que o julgamento dos 'embargos' empurre a encrenca para o Natal. Nessa época, o Judiciário mergulha no tradicional recesso. Assim, corre-se o risco de adiar a execução das penas para o ano que vem. Algo que permitira aos futuros presidiários desfrutar as festas de final de ano em família.

Noves fora uma multa de R$ 2,783 milhões, sujeita a correções, a pena de Valério foi fixada em 40 anos, um mês e seis dias de reclusão. Pela lei brasileira, ninguém pode permanecer em cana por mais de 30 anos. De resto, a legislação também prevê o regime de progressão da pena.

Com bom comportamento e reparação dos prejuízos causados ao erário, o operador do mensalão pode ter a pena podada em um sexto. Significa dizer que, mantida a pena definida nesta quarta (25), Valério ganharia o meio fio após uma permanência de seis anos e oito meses no cárcere.

Valério foi enquadrado em cinco crimes –peculato, corrupção ativa, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e formação de quadrilha. Afora a complexidade natural imposta pela combinação dos castigos com seus atenuantes e agravantes, a definição foi retardado por divergências que reacenderam o pavio de Joaquim Barbosa.

O relator do mensalão voltou a trocar desaforos com o colega revisor Ricardo Lewandowski (no vídeo lá do alto há trechos da arenga). Um queria penas mais draconianas. Outro, mais brandas. Para desassossego de Barbosa, Lewndowski prevaleceu em vários embates.

"Vossa Excelência advoga para ele?", chegou a indagar o relator a certa altura. A pecha de defensor de Valério fez o revisor escalar as tamancas: "E vossa excelência faz parte da promotoria". Presidindo a controvérsia, Ayres Britto interveio: "Ministro Joaquim, ninguém advoga para ninguém aqui!"

Mais adiante, Lewandowski voltaria à carga: "Tenho certeza de que a Corte vai levar em conta o princípio da razoabilidade na calibragem das penas, senão chegaremos a um total estapafúrdio". E Barbosa: "A minha lógica não é de vossa excelência." O colega rebate: "A minha é a da Constituição." O relator manteve o verbo em riste: "Eu não barateio o crime de corrupção."

Barbosa insinuou que Lewandowski preparava o arado para colher penas menores para os condenados petistas do núcleo político da quadrilha: "A tática de Lewandowski é plantar nesse momento o que ele quer colher daqui a pouco." Marco Aurélio Mello levou muniu-se de panos quentes: "A virulência não é produtiva". Pediu calma.

Barbosa não se deu por achado: "Vamos acelerar." E Marco Aurélio, levando o pé ao freio, recordou que a definição das penas, por relevante, não orna com a pressa. O rififi provocou um recesso extra, além do que tradicionalmente ocorre todas as tardes. Durou coisa de uma hora. Na volta, mais calmo, o relator desculpou-se com o revisor.

"Estou realmente muito preocupado com o ritmo da dosimetria e isso tem me levado a me exceder e me fez rebater de maneira exacerbada o ministro Lewandowski, a quem peço desculpas", disse Barbosa. Na sua vez de ocupar o microfone, o revisor deu o dito por não dito: . "Eu queria assinalar o gesto de grandeza de pedir desculpas. Aceito-as prontamente. Nossas divergências não desbordam do plano estritamente jurídico. A minha dosimetria é distinta da de vossa excelência."

Embora a distinção de Lewandowski tenha arrastado o voto da maioria dos colegas em várias penas, não se pode classificar os mais de 40 anos impostos a Valério como um castigo brando. Ao contrario. A punição deixou de cabelos hirtos os advogados presents ao plenário. Ficou boiando na atmosfera a impressão de que o condenado José Dirceu dificilmente se livrará da cadeia.

Em litígio com o calendário, os ministros terão de suspender o conta-gotas das penas na semana que vem. Barbosa vai ao exterior para tratar-se das dores na coluna. A coisa será retomada na semana seguinte sob o signo de uma preocupação. Tenta-se impedir que a dosimetria avance para além da aposentadoria de Ayres Britto. O presidente do STF vestirá o pijama no dia 18 de novembro, um domingo. Significa dizer que seu último dia de trabalho será a sexta-feira, 16.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.