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Josias de Souza

Dilma inicia guerra de 2014 numa conta de luz

Josias de Souza

05/12/2012 16h32

Com dois anos de antecedência, a guerra presidencial de 2014 começou num front inusitado. Dilma Rousseff escolheu como campo de batalha inaugural uma conta de luz. Arrastou os adversários tucanos para o velho e escorradio terreno em que a marquetagem brinca de rico contra pobre. Ou vice-versa.

Nesta quarta (5), discursando para uma plateia de ricos industriais, Dilma insinuou que o tucanato conspira contra os consumidores e trabalhadores pobres. Ouça-se a candidata à reeleição: "Reduzir o preço da energia é decisão da qual o governo federal não recuará, apesar de lamentar profundamente a imensa insensibilidade daqueles que não percebem a importância disso agora para garantir que nosso país cresça de forma sustentável."

Na véspera do feriado de 7 de Setembro, Dilma levara o rosto à tevê para prometer que seu governo baixaria o preço das contas de luz no início do ano pré-eleitoral de 2013. Algo que dependeria de uma repactuação com as empresas concessionárias de energia. O que ela está dizendo agora, com outras palavras, é que tem aí uns malvados que querem impedi-la de exercitar sua bondade.

Nessa versão, os estorvos seriam os governadores tucanos Geraldo Alckmin (São Paulo), Antonio Anastasia (Minas Gerais) e Beto Richa (Paraná). A tróica impediu que as estatais elétricas dos seus Estados aderissem ao plano redentor que levaria ao barateamento da energia. Fizeram isso porque acomodam as conveniências do presidenciável tucano Aécio Neves acima dos interesses do país.

Ao dizer que não recuará, Dilma informa que vai baixar o preço da conta de luz na marra. "Isso vai onerar bastante o governo federal", declarou, sob aplausos. "Quando perguntarem para onde vão os recursos orçamentários do governo, uma parte irá para suprir, para a indústria brasileira e para a população brasileira, aquilo que outros não tiveram a sensibilidade de fazer."

Dilma levanta agora uma bola que será cortada mais adiante por João Santana, o marqueteiro do PT. Os gestores tucanos invocam razões econômico-financeiras para refugar a repactuação energética sugerida por Dilma. Coisa técnica, difícil de ser trocada em miúdos. Na língua da marquetagem, que dispensa a realidade, a tradução é mais simples. Nesse idioma, os tucanos esbofeteiam os pobres duas vezes. Nas casas, conspiram contra uma economia que levaria mais pão à mesa. Nas indústrias, tramam contra uma redução de custos que, no limite, vitaminaria o emprego.

Na última vez que o PSDB caiu numa emboscada parecida, Lula grudou nas plumas dos tucanos a pecha de inimigos do Bolsa Família. Uma macumba da qual os adversários ainda não se livraram totalmente. No caso das contas de luz, quando as aves conseguirem explicar que focinho de porco não é tomada, é possível que o curto-circuito já esteja consumado.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.