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Josias de Souza

Denúncia de procurador contra Renan reabre debate sobre sucessão de Sarney no Senado

Josias de Souza

26/01/2013 20h02

Conforme a sismologia política de Brasília, só um terremoto no último grau da escala Richter arranca das mãos do senador Renan Calheiros, do PMDB de Alagoas, o triunfo na eleição para a presidência do Senado. Neste sábado (26), a seis dias da consagração, Renan foi sacudido pela notícia de que o procurador-geral da República Roberto Gurgel protocolou no STF uma denúncia contra ele.

A novidade não chegou a soterrar as pretensões de Renan. Mas produziu a reabertura do debate sobre a inconveniência de reacomodar o favorito do PMDB na cadeira à qual renunciou em 2007 envolto em acusações. A formalização da denúncia do procurador-geral "é um fato novo muito sério, que pode levar o PMDB –senão o próprio Renan— a rever a posição", acredita o senador Álvaro Dias (PR), líder do PSDB.

"Para usar uma expressão suave, considero temerário que o maior partido do Senado opte por um nome que estava sob investigação e agora foi denunciado ao Supremo", acrescenta Álvaro. "Somos 81 senadores. A opção por alguém que se encontra nessa situação diminui todo mundo e, pior, expõe a instituição ao deboche."

O risco de o caso descambar para o escárnio cresce porque a denúncia que alvejou Renan refere-se justamente ao caso que o empurrara para fora da cadeira de presidente do Senado em 2007. Envolve uma investigação sobre a renda do favorito do PMDB, acusado de recorrer ao lobista de uma empreiteira para custear a pensão de uma ex-amante com quem tivera uma filha.

Procurado, Gurgel absteve-se de comentar o teor da denúncia. Por meio da assessoria, o procurador-geral limitou-se a declarar: "Não vou dar detalhes porque o inquérito corre sob segredo de Justiça." A despeito da falta de minúcias, o incômodo já não se restringe à oposição e ao grupo de senadores ditos 'independentes'.

Longe do Congresso, o mandachuva do PMDB da Bahia Geddel Vieira Lima, ex-ministro de Lula e atual vice-presidente da Caixa Econômica Federal, disse ao repórter: "Essas circunstâncias constrangem todo o partido." Referia-se não apenas ao noticiário que engolfa Renan, mas também às manchetes que acossam o deputado Henrique Eduardo Alves, candidato do PMDB à presidência da Câmara.

Longe dos refletores, um grupo de senadores da bancada do PMDB discute a viabilidade do lançamento de um nome alternativo ao de Renan. Mencionam-se pelo menos três: Luiz Henrique (SC), Ricardo Ferraço (ES) e Eunício Oliveira (CE). Os dois primeiros contam com as simpatias da oposição. O terceiro briga até o momento para assumir o lugar de Renan na liderança do partido.

Sob o compromisso do anonimato, um dos senadores envolvidos na discussão subterrânea resumiu a encrenca: "Considerando-se o cenário atual, nenhuma candidatura alternativa parece reunir chances de prosperar no PMDB sem que Renan se disponha a sair de cena por conta própria. Ele controla a maioria da bancada, isso é inegável."

Renan vive uma situação inusitada. Tornou-se favorito à sucessão de Sarney sem jamais ter formalizado sua candidatura. No PMDB, com duas dezenas de senadores, apenas dois –os dissidentes Jarbas Vasconcelos (PE) e Pedro Simon (RS)— questionam Renan. Ainda assim…

Nem Jarbas nem Simon se animam a enfrentar Renan no voto. Sabendo-se em desvantagem, ambos preferem "marcar posição" apoiando um candidato de partido periférico. Por enquanto, há dois: Randolfe Rodrigues, do PSOL do Amapá, e Pedro Taques, do PDT do Mato Grosso. O mais bem posto é Taques. Hoje, arrastaria em plenário menos de 20 votos. Ou seja: Renan não controla apenas a maioria da bancada do seu PMDB. O denunciado controla o próprio Senado.

"Nosso entendimento com o senador Pedro Taques prevê que podemos rever a posição caso o PMDB lance outro candidato que mereça o nosso apoio", disse o tucano Álvaro Dias. E Taques: "Vou manter meu nome. Se, por obra do Espírito Santo, o PMDB chegar à conclusão de que a moralidade existe e deve ser observada, vou esperar que venham conversar comigo. O que me espanta é a falta de debate."

Ex-procurador da República, Taques acrescentou: "O PMDB tem que dar uma resposta à sociedade sobre essas denúncias. O fato de um cidadão ser denunciado não significa que ele cometeu crime. Mas a denúncia do procurador-geral da República não é uma coisa qualquer, é um ato de Estado." Renan manifestou-se por meio de nota. Escreveu que a denúncia de Gurgel é suspeita e tem contornos políticos.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.