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Josias de Souza

FHC: ‘Ingrata, Dilma cospe no prato que comeu’

Josias de Souza

26/02/2013 03h37

 

Na semana passada, ao discursar na festa de aniversáro do PT –33 anos de vida, dez dos quais no poder— Dilma Rousseff dissera: "Nós não herdamos nada. Nós Construímos." Com a frase atravessada na traqueia há dias, FHC respondeu num seminário do PSDB, em Belo Horizonte: "O que podemos dizer de uma pessoa ingrata? A presidente cospe no prato que comeu".

Em 2011, ano inaugural da gestão Dilma, FHC celebrou 80 anos. Para marcar a data, levou à web oito dezenas de mensagens de personalidades. Uma delas, escrita por Dilma Rousseff, pode ser relida aqui. Anota coisas assim: "…Há muitas características do senhor presidente Fernando Henrique a homenagear. O acadêmico inovador, o político habilidoso, o ministro-arquiteto de um plano duradouro de saída da hiperinflação e o presidente que contribuiu decisivamente para a consolidação da estabilidade econômica."

Essa Dilma de 2011 prosseguiu: "Mas quero aqui destacar também o democrata. O espírito do jovem que lutou pelos seus ideais, que perduram até os dias de hoje. Esse espírito, no homem público, traduziu-se na crença do diálogo como força motriz da política e foi essencial para a consolidação da democracia brasileira em seus oito anos de mandato."

A sucessora de Lula Arrematou: "Fernando Henrique foi primeiro presidente eleito desde Juscelino Kubitschek a dar posse a um sucessor oposicionista igualmente eleito. Não escondo que nos últimos anos tivemos e mantemos opiniões diferentes, mas, justamente por isso, maior é minha admiração por sua abertura ao confronto franco e respeitoso de ideias. Querido Presidente, meus parabéns e um afetuoso abraço!"

Agora, ao dizer que não herdou "nada", Dilma como que rasga a carta que mandara entregar ao aniversariante de 2011. Aproveitando-se da descortesia, FHC sente-se livre para propagar meias-verdades. Diz que o petismo "usurpou" os programas do PSDB. Só que não conseguiu colocá-los em prática. O país "pede outra voz."

"Há um cansaço, eles criaram o monopólio da palavra", declarou FHC, ao lado do presidenciável tucano Aécio Neves, e do governador mineiro Antonio Anastasia, dois dos bicos que o rodeavam. FHC prosseguiu:

"Corremos o risco de nos transformarmos em uma democracia deformada. O que aconteceu no Brasil foi uma usurpação de projetos. Quem não tem projeto está no governo."

Duas conclusões incontornáveis: 1) Dilma é a penúltima prova de que, em política, a gratidão tem memória curta. 2) FHC é a mais nova evidência de que o passado tem visão e audição curtas. O ex-mandarim tucano enxerga e ouve ao redor um sentimento de mudança que as pesquisas científicas de opinião ainda não lograram captar.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.