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Josias de Souza

Dilma anota ‘desaceleração’ da inflação e dos juros ao prestar contas de 2012 ao Legislativo

Josias de Souza

12/04/2013 18h42

Em ofício assinado por Dilma Rousseff, o Planalto enviou ao Congresso a prestação de contas do governo referente ao ano de 2012. O documento seguiu na semana passada. Mas a íntegra só foi divulgada na internet nesta quinta-feira (11). Nos pedaços em que trata de economia, o relatório retrata uma realidade que ajuda a entender o dilema que a presidente e seus auxiliares vivem no momento.

Nos capítulos dedicados à conjuntura econômica, ouve-se o som do bumbo: em 2012, a inflação desacelerou e os juros recuaram, anota o texto. Até aí, nada de novo. A novidade é que o baticum chega aos congressistas num instante em que a carestia faz careta e até o ministro Guido Mantega (Fazenda) já admite que o Banco Central pode ter que elevar os juros. Quer dizer: os dados de 2012 são esmiuçados em ambiente eletrificado.

Lê-se na prestação de contas do Planalto: "A inflação apresentou trajetória de desaceleração em 2012, comparativamente a 2011, resultado associado a menores reajustes de preços administrados e a comportamento mais favorável no segmento dos preços livres, apesar de pressões pontuais ocorridas no grupo 'alimentação' e da reversão no movimento descendente dos preços de serviços a partir de meados do ano."

Hoje, as pressões inflacionárias exercidas pelos alimentos já não são tão "pontuais". E a curva "descendente" dos serviços experimenta reversão mais acentuada. Juntos os preços da comida e o custo de manter em casa uma empregada doméstica responderam por 73% do índice de inflação de março de 2013, que ficou 0,47%. Isso antes da regulamentação da PEC das domésticas, recém-promulgada.

Por sorte, manda a lei que o governo preste contas ao Congresso 60 dias depois do início do ano legislativo. Como deputados e senadores só começam a trabalhar em fevereiro, o Planalto tem até o final de março para lapidar o texto da sua prestação de contas. Foi o que fizeram os redatores do documento de 2012 ao incluir na peça uma tentativa de explicação para o efeito tomate:

"Após registrar recuo no primeiro semestre [de 2012], o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulado em doze meses acelerou a partir de julho, como consequência de pressões inflacionárias no segmento de alimentação. Essas pressões foram, na maior parte, decorrentes de choques nos preços de produtos in natura e de grãos."

Feita a ressalva, o documento retorna ao bumbo: "Ainda assim, no ano, a variação do IPCA atingiu 5,84%, dentro do intervalo fixado pelo Conselho Monetário Nacional, de 2,5% a 6,5%, o que configura o nono ano consecutivo de cumprimento da meta pelo Banco Central do Brasil."

Por mal dos pecados, esse registro foi à internet um dia depois da divulgação da notícia que desautorizou os fogos: revelado o IPCA de março (0,47%), a máquina de calcular informa que a inflação acumulada nos últimos 12 meses bateu em 6,59%— acima, portanto, do teto da meta oficial de 6,5%.

Há mais bumbo no pedaço do relatório que trata dos resultados da política monetária em 2012: "O Copom realizou oito reuniões no ano. Nas sete primeiras reuniões, a taxa de juros básica foi reduzida, enquanto na última reunião do ano optou-se por manter a taxa em 7,25% ao ano."

O documento realça que, de janeiro a novembro de 2012, houve "redução de 375 pontos básicos na taxa de juros". Insinua que a queda poderia ter sido maior não fosse a combinação de dois fatores adversos: o "cenário de persistência de riscos limitados para a inflação", associado às "incertezas" que, produzidas pelo "cenário externo", inibiram "a utilização da capacidade produtiva" do país.

Agora, mal 2013 entrou em abril e o mercado já dá de barato que o Banco Central vai elevar os juros. Discute-se apenas se isso será feito já na reunião do Copom marcada para a semana que vem ou no encontro subsequente. Lendo-se o balanço governamental referente ao ano passado, compreende-se o porquê de Dilma Rousseff ter dito na África do Sul, na rumorosa entrevista do mês passado, que não crê em política de combate à inflação que sacrifique o crescimento econômico.

Uma candidata à reeleição que vinha se jactando de cortar os impostos da cesta básica não orna com a presidente do tomate 122,13% mais caro. Do mesmo modo, a presidenciável dos juros declinantes não combina com a perspectiva de elevação, ainda que moderada, da taxa Selic. Como se fosse pouco, há um complicador.

Normalmente, o BC costuma lançar mão do antídoto dos juros contra o veneno da inflação nos momentos em precisa jogar água fria no consumo. O diabo é que agora os preços fogem ao controle em meio a uma economia que vem de um crescimento ridículo em 2012: 0,9 %. Daí aquela frase de Dilma segundo a qual o remédio não pode matar o paciente.

Na escrituração do ano passado, o tópico que mais orgulha a presidente-candidata é a evolução do emprego. O relatório anota: "Em 2012, uma das características marcantes da economia do país foi o mercado de trabalho, que continuou demonstrando forte dinamismo. A taxa de desemprego de dezembro de 2012, segundo o IBGE, foi de 4,6%, e foi a mais baixa da série histórica para o mês."

O texto prossegue: "No acumulado do ano até novembro, a geração de novos postos de trabalho alcançou 1,3 milhão. A continuidade das contratações em termos líquidos reforça que a economia retoma o crescimento." Decerto não será difícil entregar em 2013 um PIB maior que os 0,9% do ano passado. Nada próximo, porém, dos 4% e até 5% que já pingaram dos lábios do ministro Mantega. A questão agora é outra.

Quais serão os efeitos colaterais da terapia anti-inflacioária?, eis a questão que embatuca Dilma e seus operadores políticos. Foi de olho nessa combinação de juros ascendentes com economia desaquecida que a presidente repisou na África do Sul a tese segundo a qual o remédio não pode matar o paciente. Nesta sexta (12), o Banco Central divulgou uma prévia do PIB. Em janeiro, a economia crescera 1,43%. Em fevereiro, deu marcha à ré. Caiu 0,52%.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.