Protestos devem favorecer Marina e sua #rede
Os megaprotestos do outono-inverno do Brasil constituem em fenômeno novo. Poucas vezes o brasileiro contemporâneo experimentou um momento como o atual, em que a pessoa tem a consciência de estar vivendo a história enquanto ela se realiza, não depois que já virou livro. Tudo acontece vertiginosamente, numa simultaneidade que desorienta. E, como a história está no começo, nem sempre é fácil entendê-la na hora. Pode-se, porém, fazer conjecturas lógicas.
Os protestos favorecem Marina Silva, eis o primeiro indício que se pode extrair dos fatos. Na sucessão de 2010, ela colecinou quase 20 milhões de votos. O grosso do seu eleitorado tinha a cara do jovem que agora vai às ruas. Os manifestantes têm aversão a partidos políticos. No gogó, a sem-legenda Marina também maldiz as legendas tradicionais. A revolta nasce, cresce e se organiza na tribuna virtual das redes sociais. O mesmo espaço que Marina utiliza como alavanca para criar a sua #rede.
Os outros presidenciáveis disseram que é preciso ouvir a voz das ruas. Marina animou-se a interpretar o dialeto da tribo que se pintou para a guerra. Fez isso num vídeo levado à web, a aldeia dos manifestantes. "As pessoas não estão suportando mais essa situação de impotência para transformar politicamente aquilo que de fato elas querem que seja transformado", disse. Espremendo-se, é nada. Mas esse nada traduz à perfeição o principal slogan das ruas: "somos contra tudo isso que está."
Vale a pena ouvir um pouco mais de Marina: "A cada ano que passa as pessoas vão percebendo que o monopólio da política, exercido pelos grandes partidos, as coloca no lugar de meros espectadores da política. […] A força desse movimento é que ele é autoral. Ele não é dirigido por partido, sindicado, ONGs e nem por liderança carismática. Ele é um movimento horizontal." Hostilizada nas passeatas desta quinta (20), a turma do PT e da CUT agora já sabe do que Marina está falando.
No último Datafolha, aquele em que a popularidade de Dilma Rousseff despencou 8 pontos percentuais, Marina reteve seus 16% de intenções de voto, dois pontos percentuais acima dos 14% atribuídos ao tucano Aécio Neves. Com 51%, Dilma recuou para uma região fronteiriça. Daí para cima, prevalece no primeiro turno. Para baixo, sujeita-se aos riscos de uma disputa em dois turnos. Riscos que crescem na proporção direta do fortalecimento de Marina.
Ainda que não vá ela própria para a fase final, Marina pode ser decisiva para empurrar alguém. Não fosse pelo desempenho dela, o tucano José Serra teria amargado em 2010 um nocaute no primeiro round. Feitas essas considerações, evolua-se para o segundo indício provido pelos penúltimos acontecimentos: a eletrificação do asfalto desfavorece os governantes sob questionamento e seus respectivos partidos.
Enquanto se concentravam no preço das passagens dos transportes coletivos, os manifestantes minava, em São Paulo, Fernando Haddad (PT) e Geraldo Alckmin (PSDB). E no Rio, Eduardo Paes e Sérgio Cabral, ambos do PMDB. Nessa fase, gente como Dilma e o antagonista tucano Aécio Neves eram atingidos apenas de raspão. Porém…
A rapaziada passou a exigir mais do que o mero cancelamento do reajuste de R$ 0,20. Fala agora contra a corrupção. Exige a adoção de um certo "padrão Fifa" nas áreas de saúde e educação. Dilma e o PT fazem pose de solução. Mas a garotada os enxerga como parte do problema. Convencionou-se dizer que a culpa é das redes sociais. Bobagem.
A internet facilita e apressa o protesto. Mas a turba está irritada não por causa do computador. Perde a paciência porque lhe falta serviço público de boa qualidade. Descobriu que ter acesso ao Facebook é fácil. O difícil é ter acesso a um hospital ou uma escola pública que preste. Adicionando-se à mistura a inflação e o PIB mixuruca, chega-se ao caldeirão que faz 2013 tremer e transforma a história de 2014 num verbete em aberto.
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