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Josias de Souza

‘Bolsa FAB’ dissolve ‘agenda positiva’ de Renan

Josias de Souza

04/07/2013 16h36

Quando Renan Calheiros informou no plenário, diante dos olhos da TV Senado, que havia montado uma agenda positiva porque estava preocupado com a Opinião Pública, a própria Opinião Pública estranhou: "Preocupado com o quê?!?"

Impressionado com o ronco do asfalto, Renan reunira os líderes. Formara-se entre eles um consenso de que era preciso corresponder aos anseios da Opinião Pública. E a Opinião Pública: "Os seios de quem?!?"

É compreensível que a Opinião Pública tenha reagido mal. Ela jamais suspeitou que tivesse tanto prestígio no Senado. A Opinião Pública se perguntava, atônita: "Que mumunhas os senadores deixaram de fazer por que estavam preocupados com meus seios, digo, anseios?"

Ainda outro dia a Opinião Pública enviara ao Senado 1,6 milhões de assinaturas contra a volta de Renan à presidência da Casa. Mas Ela não estranhou quando os senadores deram de ombros para sua iniciativa. Estranho mesmo era esse prestígio tardio!

Meio sem jeito, com um pé atrás, a Opinião Pública começou a observar os senadores. Esqueceram as festas juninas. Trabalharam no dia do jogo da seleção brasileira. Tornaram a corrupção crime hediondo. Destinaram a grana dos royalties para educação e saúde. Engatilharam o fim do voto secreto… E a Câmara dançava no mesmo ritmo. Hummm!!! Será?!?

Quando a Opinião Pública começava a se orgulhar da sua nova importância, sobrevieram as notícias sobre o programa Bolsa FAB. O presidente da Câmara viajando com a família para ver a final da Copa das Confederações, no Rio. O do Senado voando com a mulher para o casamento da filha de um colega, na Bahia.

Henrique Eduardo Alves ainda esboçou um gesto de contrição. Pagou preço de voo de carreira por serviço de táxi aéreo. Mas Renan não se arrepende de nada. Fará tudo de novo. Disse ter ido ao casamento como presidente do Senado. E o presidente do Senado, a Opinião Pública deveria saber, tem direito "a transporte de representação". Que diabos, "é um chefe de Poder."

A Opinião Pública murchou na poltrona. Ela começava a desconfiar que seu novo status tomava o caminho do beleléu. Teve certeza quando ouviu Renan sustentar que a FAB  não pode dizer isso ou aquilo. "Nós é que temos o que dizer para a FAB. O transporte é em função da chefia do poder, da representação. A lei não diz que [o compromisso] tem que estar na agenda, não. Isso não é pré-condição para estar dentro da lei."

A Opinião Pública, que estava muito preocupada, resolveu relaxar. No final de semana, vai ligar o computador na tomada e conectar-se ao Facebook. Começou a planejar a próxima passeata. Já idealizou uma faixa. Nada de 'Fora Renan.' Inspirada no Bolsa FAB, a Opinião Pública pensou numa coisa mais elaborada. Algo assim: "Me bate, me joga contra a parede, me arranca tudo à força, e depois me chama de contribuinte!" Não fez bem à Opinião Pública saber que o Renan anda reparando nos seus "anseios".

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.