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Josias de Souza

Bolsa Família: Dilma deve pedido de desculpas

Josias de Souza

12/07/2013 20h24

 

A Polícia Federal concluiu, finalmente, o inquérito sobre os boatos que tumultuaram a vida da clientela do Bolsa Família em maio. Descobriu-se que Dilma, Lula e alguns ministros têm péssima pontaria. Atiraram para os lados, como quem mira inimigos da oposição. E acertaram o governo pelas costas. Não há culpados. Nem crime houve. Aconteceu, no máximo, uma tentativa de suicídio. Ou governicídio.

Segundo a PF, a boataria que levou milhares de pessoas às agências da Caixa Econômica teve propagação "espontânea". Insista-se: não existem culpados. A ministra petista Maria do Rosário (Direitos Humanos) ainda não voltou ao Twitter. Quando os acontecimentos ainda engatinhavam, ela escrevera no seu microblog: "Boatos sobre fim do Bolsa Família devem ser da central de notícias da oposição".

Após inquirir duas centenas de pessoas, a PF anotou no seu relatório que não encontrou "elementos que possam configurar crime ou contravenção penal." Dilma Rousseff ainda não voltou aos refletores. Em maio, munida apenas de sua perspicácia, a presidente comentara os boatos em timbre acusatório (reveja no vídeo lá do alto).

"É algo absurdamente desumano. O autor desse boato é criminoso. Por isso colocamos a Polícia Federal para descobrir quem tinha por objetivo dar intranquilidade aos milhões de brasileiros que nos últimos 10 anos estão saindo da pobreza extrema", afirmara Dilma, em viagem ao município pernambucano de Ipojuca.

Lula ecoaria sua pupila uma semana mais tarde: "Só espero que se descubra quem fez isso porque brincar com as pessoas mais pobres deste país é uma ofensa. Eu não sei quem teria condições de fazer uma brincadeira estúpida dessa." A exemplo da sucessora, o ex-soberano também não retornou à boca do palco para se recompor em cena. Aliás, anda sumido o Lula!

Além de interrogar pessoas, a PF varejou as redes sociais. Encontrou apenas "uma postagem". Coisa "feita pela filha de uma beneficiária." Falava "sobre o saque antecipado de sua mãe". Para os investigadores, essa postagem "não foi a origem dos boatos." Também "não ficou configurada a utilização de rádios comunitárias, telemarketing ou empresa contratada para a disseminação da informação de cancelamento do programa." Resta à plateia aguardar por um novo pronunciamento do ministro José Eduardo Cardozo (Justiça).

Superior hierárquico da PF, Cardozo afirmara, no alvorecer das investigações: "Evidentemente houve uma ação de muita sintonia em muitos pontos do território nacional, o que pode ensejar a avaliação de que alguém quis fazer isso deliberadamente, planejadamente, articuladamente. Não dá para afirmar isso ainda, mas seguramente as situações nos levam a cogitar essa hipótese."

Afastadas as insinuações levianas, as acusações precipitadas e as conclusões tolas, sobrou um fato incontestável: sem comunicar nada aos milhões de beneficiários do programa, a Caixa Econômica antecipou os pagamentos na véspera do tumulto. Em vez de depoistar os benefícios escalonadamente, como sempre fez, o banco estatal derramou a dinheirama nas contas de 13,8 milhões de pessoas de uma tacada. Assim mesmo, de supetão.

Em seu relatório, a PF chama a barbeiragem da Caixa pelo apelido: "fator desassociado". Nessa versão, a incompetência do banco estatal a juntou-se a outros fatores que, "desassociados" uns dos outros, produziram o fenômeno do boato "espontâneo". Já se sabia que investigar boato é algo tão díficil quanto encaixotar fumaça. Mas a PF, com rara habilidade, demonstrou o seguinte: desde que você se faça de surdo, de cego, e de débil mental o inaceitável é perfeitamente aceitável.

Está entendido que a Caixa exercitou sua incompetência com máxima competência. Mas a PF pede que você acredite que a instituição não teve nada a ver com coisa nenhuma. Vamos lá, faça um esforço. Você consegue. Afinal, suicídio não é crime. Portanto, continue pagando os seus impostos regularmente. E vê se não enche o saco.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.