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Josias de Souza

Dilma: paralisar obra é um ‘absurdo’! Heimmm?

Josias de Souza

08/11/2013 19h29

Foto: Roberto Stuckert Filho

Foto: Roberto Stuckert Filho

Em entrevista a emissoras de rádio gaúchas, Dilma Rousseff se insurgiu contra o relatório do TCU que recomendou a interrupção de verbas para sete obras nas quais foram detectadas irregularidades graves. "Eu acho um absurdo paralisar obra no Brasil, você pode usar de vários métodos, mas paralisar obra é algo extremamente perigoso."

Dilma prosseguiu: "Por quê? Porque depois ninguém repara o custo. Se houve algum erro por parte de algum agente que resolveu paralisar, não tem quem repare, a lei não prevê. Então se para por um ano ou para por seis meses, ou para por três meses, ninguém te ressarce depois."

Uma das obras que constam da lista de empreendimentos irregulares do TCU é a ferrovia Norte-Sul. Tomada ao pé da letra, Dilma deseja continuar despejando verbas do contribuinte no empreendimento sem que nenhum auditor encha o saco. Vale a pena recordar no que se converteu a Norte-Sul.

Nascida de um conluio entre empreiteiras, em 1987, sob José Sarney, a Norte-Sul deveria ligar o Pará ao Rio Grande do Sul. Sob Lula, ganhou impulso o trecho que ligaria Palmas, no Tocantins, a Anápolis, em Goiás. Despejaram-se nesse percurso R$ 4,2 bilhões. Lula prometera cortar a fita da obra em 2008. Até agora, nada.

Nessa época, era Lula quem guerreava contra o TCU. Dilma era apenas a ministra do PAC, mãe do programa de obras. O TCU visitou a Norte-Sul na ocasião. Seus auditores estavam munidos de planilhas que davam a obra como pronta. Encontraram 280 quilômetros inacabados. Verificaram que a empreiteira "responsável" fora agraciada com 17 aditivos contratuais. Farejaram um sobrepreço de R$ 27 milhões.

Chamava-se José Francisco das Neves —Juquinha para os amigos— o presidente da Valec, estatal que cuida das ferrovias. Empossada na Presidência em 2011, Dilma mantivera Juquinha em sua cadeira. Súbito, a Procuradoria da República –outra repartição que tem mania de atrapalhar o bom andamento das obra$— acusou Juquinha de desviar R$ 71 milhões da Norte-Sul. O doutor deixou a Valec. Sorte de Dilma.

Quando Juquinha dormiu cinco noites na cadeia, já não era presidente da estatal ferroviária. Hoje, responde a múltiplos processos. Tem os bens bloqueados. E a Norte-Sul, estrela de todas as listas negras do TCU, é um fiasco pendente de explicação.

Ocupada em desqualificar os órgãos de controle, a ex-mãe do PAC ainda não teve tempo de prover as explicações. Mas já devolveu o Ministério dos Transportes, com a Valec de cambulhada, ao Partido da República, a mesma legenda que avalizara a nomeação do companheiro Juquinha.

Dilma está preocupada com o custo da paralisação das obras. "Se houve algum erro por parte de algum agente que resolveu paralisar, não tem quem repare, […] ninguém te ressarce depois." Se tivesse tempo, Dilma tocaria o telefone para a Advocacia-Geral da União. Perguntaria: quanto já recuperamos dos desvios da Norte-Sul? Ouviria a seguinte resposta: nenhum tostão. Se a agenda lhe desse folga, Dilma telefonaria para a Valec. Como anda a Norte-Sul?, ela perguntaria. E a estatal: a Norte-Sul não anda, presidenta.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.