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Josias de Souza

Câmara cogita aposentar Genoino, não cassar

Josias de Souza

20/11/2013 05h30

Encarcerado no presídio da Papuda há quatro dias, José Genoino (PT-SP) deve receber da Câmara um tratamento diferenciado. Em vez de submetê-lo a um processo de cassação do mandato, a direção da Casa cogita conceder-lhe uma aposentadoria por "invalidez".

Genoino submeteu-se a uma cirurgia cardíaca em julho. Durou seis horas. Seguiu-se uma internação de 26 dias no Sírio-Libanês. Após receber alta, requereu aposentadoria à Câmara. Fez isso num instante em que já colecionava no STF uma pena de 6 anos e 11 meses de cadeia, em regime semiaberto.

Médicos da Câmara examinaram Genoino em São Paulo. Recomendaram uma licença de 120 dias. Vai expirar em 6 de janeiro de 2014. Até lá, uma junta médica dirá se Genoino faz mesmo jus ao pijama de inválido. Imaginou-se que tudo isso ocorreria antes da execução da pena imposta pelo STF.

Genoino foi condenado por dois crimes: corrupção ativa (4 anos e 8 meses) e formação de quadrilha (2 ano e três meses). Valendo-se dos embargos infringentes, recorreu contra a segunda imputação. Com isso, seus advogados imaginaram que o veredicto definitivo seria adiado para meados de 2014.

Na semana passada, porém, o presidente do STF, Joaquim Barbosa, submeteu à consideração do plenário do tribunal a ideia de executar o castigo dos mensaleiros em fatias. Barbosa sustentou a tese de que, nos trechos em que eram insuscetíveis de recursos, as sentenças deviram ser cumpridas imediatamente.

O entendimento de Barbosa prevaleceu no STF por unanimidade. Assim, enquanto aguarda o julgamento do recurso contra a imputação de quadrilheiro, Genoino foi em cana pela corrupção ativa. Na noite desta terça-feira (19), com atraso de quatro dias, o presidente do STF enviou à Câmara notificação sobre a novidade.

Deve-se o envio do documento ao fato de haver um deputado entre os detidos. A Câmara precisa agora decidir o que fazer com Genoino. Já deliberou que irá respeitar os quatro meses de licença médica. Pelo menos até janeiro, o preso continuará recebendo normalmente os vencimentos de R$ 26,7 mil mensais.

O ofício de Barbosa chegou à Câmara por volta das 21h. Mais cedo, o presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), queixara-se da demora. Depois, sua assessoria considerou o texto da comunicação demasiado vago. Faz menção a todos os condenados, não apenas aos deputados –além de Genoino, já preso, aguardam na fila Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-SP).

Mantida a tendência atual, a Câmara não deve cassar automaticamente os mandatos dos condenados. Avalia que cabe ao plenário decidir. No caso de Genoino, planeja-se abortar o julgamento político por meio da concessão da aposentadoria.

Desse modo, Genoino deixaria a Câmara "pela porta da frente", disse um correligionário do PT. E sairia de cena com o bolso forrado pela aposentadoria vitalícia e integral. No documento que enviou ao presidente da Câmara, Barbosa anotou:

"Comunico a Vossa Excelência, para fins do artigo 15, inciso III da Constituição Federal que o Supremo Tribunal Federal, na sessão plenária realizada em 13 de novembro de 2013, proferiu decisão colegiada nos autos em epígrafe, nos termos da certidão de julgamento anexada por cópia."

No trecho citado por Barbosa, o texto constitucional anota que perde os direitos políticos o cidadão alcançado por "condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos." Quer dizer: sem direitos políticos, o lógico seria que o condenado fosse privado também do mandato.

No caso de Natan Donadon (ex-PMDB-RO), condenado a 13 anos de cadeia, a Câmara optou por não cassar. Quanto a Genoino, tende a aposentar. Para que esse desfecho se materialize, é essencial que o condenado convença Barbosa, relator do processo do mensalão, da gravidade de sua doença.

Genoino invoca a saúde débil para reivindicar a migração do regime semiaberto para o domiciliar. Nesta terça, por ordem da Vara de Execuções Penais do DF, Genoino deixou o presídio para ser examinado por dois médicos no IML da Capital. O laudo vai às mãos de Barbosa.

Se o ministro concluir que a debilidade da saúde faz de Genoino um candidato a presidiário domiciliar, estará pavimentado o caminho que levará a Câmara a conceder-lhe a aposentaria.

Atualização feita às 13h15: O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, informou na manhã desta quarta (20) que a Câmara não vai impor a José Genoino a cassação automática. Contrariando o STF, planeja abrir um processo que seguirá para a Comissão de Constituição e Justiça antes de desaguar no plenário. Esse roteiro é parte da coreografia que deve levar à aposentadoria de Genoino. Se funcionar, o pijama chega antes da absolvição em plenário.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.