Agnelo Queiroz visitou José Dirceu na Papuda
O governador petista do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, visitou secretamente o correligionário José Dirceu no Complexo Penintenciário da Papuda. A visita ocorreu no último dia 20 de fevereiro. Não constava da agenda do governador. Tampouco foi autorizada pela Vara de Execuções Penais do DF, responsável pela execução das penas dos condenados do mensalão.
A informação foi veiculada na última edição da revista Veja. Procurado, Agnelo manifestou-se por meio de uma nota de sua assessoria. No texto, confirmou que esteve com Dirceu na prisão. Em justificativa cândida, disse que o encontro foi "casual". Alegou ter participado de uma inauguração em local próximo da Papuda. E "aproveitou" o evento para realizar uma "inspeção" na penitenciária.
Durante a pseudoinspeção, informa a nota, o governador "encontrou-se com o ex-ministro e ex-deputado federal José Dirceu. Eles trataram de assuntos pessoais e o ex-ministro manifestou sua expectativa em relação ao julgamento de recurso junto ao Supremo Tribunal Federal".
A revelação vem à luz num instante em que o juiz Bruno André Silva Ribeiro, da Vara de Execuções Penais do DF, cobra do próprio governador Agnelo explicações sobre os privilégios ilegais concedidos aos detentos do PT. Entre eles as visitas realizadas sem prévia autorização da Justiça e fora dos horários regulamentares.
Antes da conversa com Agnelo, Dirceu recebara na cadeia a visita de Heverton Gisclan Silva, advogado da Defensoria Pública da União. Deu-se em 6 de janeiro, uma segunda-feira, dia em que não são previstas visitas aos presos. Nesta semana, abriu-se na Vara de Execuções Penais uma investigação para apurar as circunstâncias da entrada do defensor da União na Papuda.
Em resposta a um ofício recebido do Ministério Público do Distrito Federal há quatro dias, o juiz Bruno Ribeiro assinou há dois dias despacho sobre o "tratamento diferenciado" que os mensaleiros presos em Brasília vêm recebendo. O documento pode ser lido aqui. Entre outras providências, o magistrado ordenou o envio de um questionário a ser respondido por Agnelo Queiroz "no prazo de 48 horas".
No documento, o juiz da Vara de Execuções Penais pergunta ao governador "se já foi instaurada investigação interna para apurar a responsabilidade funcional" pelas regalias supostamente concedidas aos presos do mensalão. Indaga "quais as medidas a serem adotadas, no curto prazo, para a retomada do comando do sistema prisional". Questiona "se o DF tem condições de custodiar os sentenciados" do mensalão. O juiz esclarece que não se refere apenas à "integridade física" dos presos. Preocupa-se inclusive com "ingerências políticas na administração do sistema penintenciário local."
Quando enumerou as questões dirigidas a Agnelo o magistrado desconhecia que o próprio destinatário do seu ofício estivera na Papuda. Sem querer, Bruno Ribeiro produziu um paradoxo: requereu de um potencial violador das regras prisionais informações sobre as providências adotadas contra as violações.
No seu despacho, Bruno Ribeiro reproduz trechos do ofício que recebera do Ministério Público do DF em 25 de fevereiro. Disponível aqui, o texto é assinado por seis promotoras responsáveis pela fiscalização da execução de penas na Capital da República. O juiz realça: "Na petição, [as promotoras] consignam que 'privilégios e ingerência indevida do Executivo local continuam a acontecer no interior do sistema prisional do DF", especialmente na Papuda e no Centro de Progressão Penitenciária (CPP), "onde se encontram parte dos condenados da Ação Pena 470", do mensalão.
Nesta sexta-feira, o juiz mandou de volta para a Papuda o detento Delúbio Soares. Ele se encontrava no CPP, unidade prisional destinada aos presos do regime semiaberto que já foram autorizados a trabalhar fora da cadeia durante o dia. A autorização concedida a Delúbio para dar expediente na CUT de Brasília foi suspensa até que sejam esclarecidas as denúncias sobre os privilégios ilegais —de visitas fora de hora à degustação de uma feijoada na cadeia. Daí o retorno de Delúbio à Papuda, onde estão presos Dirceu e o ex-deputado João Paulo Cunha.
O juiz determinou à direção do CPP, a unidade onde Delúbio estava preso, "a instauração de inquérito disciplinar para apurar "as irregularidades e privilégios" supostamente concedidos ao ex-gestor das arcas clandestinas do PT. Requisitou "cópia do relatório de entrada e saída" de Delúbio no período em que ele estava autorizado a deixar a cadeia para trabalhar. Anotou que o relatório deve conter "os respectivos horários".
Requisitou informações também à Subsecretaria do Sistema Penitenciário (Sesipe), órgão do governo do DF. O magistrado determinou que seja entregue à Vara de Execuções Penais, em 48 horas, a "lista completa de todas as visitas realizadas aos apenados" na ação penal do mensalão. Vale para os registros feitos na Papuda e também no CPP. Exigiu dados detalhados, com "dia e hora", além dos nomes dos visitantes. Minucioso, o juiz especificou que os nomes devem ser informados mesmo quando o visitante for "autoridade pública, política ou não".
A menção a "autoridade pública" não foi gratuita. Quando redigiu seu despacho, o juiz Bruno Ribeiro não sabia que o governador Agnelo visitara Dirceu em segredo. Mas o ofício do Ministério Público do DF já o havia alertado para o fato de que "o deputado distrital Chico Vigilante (PT-DF) faz visitas a internos do CIR (Papuda) quando quer, sem autorização judicial, apenas com permissão das autoridades da unidade prisional." Vigilante esteve pelo menos duas vezes com Dirceu.
Caso se confirmem as suspeitas de concessão aos presos do mensalão de regalias sonegadas aos detentos anônimos do sistema prisional de Brasília, as consequências podem ser graves. A autorização dada a Delúbio para trabalhar na CUT, por ora apenas suspensa, pode ser cancelada em definitivo. O pedido de Dirceu para trabalhar no escritório de um advogado de Brasília, em fase de análise, pode ser indeferido. De resto, o juiz Bruno Ribeiro pode sugerir ao ministro Joaquim Barbosa, presidente do STF e relator do mensalão, a transferência dos dos condenados do PT para um presídio federal, longe de Brasília.
Quando foram presos, em 15 de novembro do ano passado, os condenados petistas consideraram arbitrária a decisão de Barbosa de trazê-los para Brasília, em avião da Polícia Federal. Curiosamente, nenhum dos presos do PT requereu a transferência para seus Estados de origem. Em petição endereçada ao presidente do Supremo, a defesa de José Genoino foi a única a mencionar o desejo do preso de retornar a São Paulo, mas só na hipótese de lhe ser concedido o pedido de prisão domiciliar. Se a opção de Barbosa for a de devolver Genoino ao xadrez, ele também prefere permanecer em Brasília. A essa altura, é desnecessário especular sobre os motivos.
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