Câmara segura há 7 meses julgamento de deputado do PSDB ligado a Cachoeira
Para o deputado Carlos Alberto Leréia (PSDB-GO), o tempo não existe. Só existe o passar do tempo. Pilhado pela Polícia Federal num relacionamento monetário com o megacontraventor Carlinhos Cachoeira, Leréia espera há sete meses pelo dia em que será julgado por seus pares no plenário da Câmara. E espera. E espera. E espera….
Reunido em 11 de setembro de 2013, o Conselho de Ética da Câmara aprovou relatório que impõe a Leréia a pena de suspensão do exercício do mandato por 90 dias. Antes de ser aplicado, o castigo precisa ser referendado pelo plenário da Casa. Leréia espera.
Enquando mata o tempo, Leréia assiste à formação de um cemitério de mandatos. Já testemunhou, na Casa ao lado, a cassação do mandato senador-conterrâneo Demóstenes Torres (ex-DEM-GO), cuja reputação também foi engolfada pela proximidade com Cachoeira. E espera.
Já presenciou a absolvição, o rejulgamento e a condenação do deputado-presidiário Natan Donadon (ex-PMDB-RO). E espera. Já viu as renúncias dos mensaleiros José Genoino (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP), Pedro Henry (PP-MT) e João Paulo Cunha (PT-SP). E espera.
Já se despediu do correligionário Eduardo Azeredo (PSDB-MG). Protagonista do mensalão tucano de Minas Gerais, Azeredo abdicou do mandato para trocar uma provável condenação no STF pela perspectiva de prescrição na primeira instância do Judiciário, em Belo Horizonte. E Leréia espera.
Já acompanhou a renúncia de Asdrúbal Bentes (PMDB-PA), condenado no STF por trocar ligaduras de trompas por votos numa eleição municipal de 2004. E continua esperando.
Agora, Leréia presencia o derretimento-relâmpado da reputação do ex-vice presidente da Câmara, André Vargas (PT-PR), flagrado em promíscuas conexões com o doleiro Alberto Youssef.
Incomodado com o ritmo de toque de caixa que o Conselho de Ética imprime à tramitação do pedido de cassação do companheiro André Vargas, o deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP) realça a anomalia: "Se a Câmara julgar o André antes de apreciar o caso do Leréia, será um escândalo."
Vacarrezza integrava a CPI do Cachoeira, em 2012, quando Leréia tentou explicar à comissão suas inexplicáveis relações com o superbicheiro goiano. O tucano não negou o que os grampos da PF haviam transformado em inegável. Porém, a exemplo de todos os outros encrencados, Leréia tornou-se beneficiário da pizza assada no forno da CPI. E espera.
Ainda em 2012, Leréia foi levado à Corregedoria da Câmara. Relator do caso, Jerônimo Goergen (PP-RS) recomendou, ao final da sindicância, que o processo fosse remetido ao Conselho de Ética. Concluiu que eram densos os indícios de envolvimento do tucano com Cachoeira.
Noves fora a suspeita de manter uma sociedade com Cachoeira num avião e num terreno, os diálogos grampeados pela PF indicavam que Leréia recebera dinheiro do contraventor. Numa das escutas, o superbicheiro recita para Leréia a senha de um cartão de crédito.
Em relatório confidencial da PF, Leréia aparece num trecho intitulado "transações financeiras". O texto reproduz conversas de Cachoeira com seus comparsas. Numa delas, o proto-contraventor pede a Geovani Pereira da Silva, então contador de sua quadrilha, para "passar dinheiro" ao deputado tucano.
Num grampo de 1.º de agosto de 2011, Cachoeira encomenda a Geovani o repasse de R$ 20 mil a Leréia. Deu instruções específicas. O dinheiro deveria ser entregue "embrulhado em jornal". O PSDB ameaçou expulsá-lo. E nada. Leréia espera.
No Conselho de Ética, Leréia defendeu-se alegando que era "apenas amigo" de Cachoeira. Sustentou que nada tinha a ver com os crimes do personagem. Primeiro relator do processo, Ronaldo Benedet (PMDB-SC) propôs que o mandato de Leréia fosse passado na lâmina. Mas seu relatório foi rejeitado.
Nomeou-se um segundo relator: Sérgio Brito (PSD-BA). Que sugeriu a pena alternativa da suspensão do exercício do mandato por 90 dias, com a consequente suspensão do contracheque e de de todas as verbas que bancam o funcionamento do gabinete. Foi esse relatório que o Conselho de Ética aprovou em 11 de setembro de 2013. Mas Leréia, na bica de disputar nova eleição daqui a seis meses, ainda espera.
Para Leréia, o tempo não existe. Para André Vargas, o tempo não passa. Já passou. Mais morto do que vivo, o deputado petista já entregou o cargo de vice-presidente da Câmara e tirou uma licença de 60 dias.
Pressionado pelo PT, que receia que sua sangria respingue na legenda, Vargas anunciou que renunciaria ao mandato. Porém, decorridas 48 horas, renunciou à ideia da renúncia. A paciência da cúpula do petismo, ilimitada com os mensaleiros presos, esgotou-se para André Vargas.
Com a solidariedade já bem cansada, o PT inaugurou nesta quinta-feira o movimento 'fora, Vargas'. Puxam o coro da renúncia o próprio presidente do PT federal, Rui Falcão, e o líder da legenda na Câmara, Vicentinho (SP).
Enquanto isso, o tucano Leréia, personagem em cujo passado só existe futuro, atravessa o presente usufruindo do doce hábito de ver o pretérito passando. O senador Aécio Neves, presidenciável do PSDB, talvez devesse dizer meia dúzia de palavras sobre Leréia.
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