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Josias de Souza

Processo contra Vargas é irreversível, diz Alves

Josias de Souza

22/04/2014 05h32

De volta de uma viagem oficial à China, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), declarou que o processo aberto no Conselho de Ética contra o deputado André Vargas (PT-PR) tornou-se "irreversível". Será levado ao plenário mesmo que o parlamentar resolva renunciar ao seu mandato.

A renúncia só seria um lenitivo para André Vargas se ele a tivesse formalizado antes da instauração do processo, explicou Henrique. O Conselho de Ética já nomeou inclusive um relator para o caso, o deputado Júlio Delgado (PSB-MG). "Na hora que se instaurou, o processo passou a ser irreversível", enfatizou o presidente da Câmara. "Não há mais como reverter a situação."

Henrique disse ter comunicado sua decisão ao próprio André Vargas. Fez isso na semana passada, na quinta-feira (17), quando ainda estava do outro lado do mundo. Contou que foi acordado por um telefonema do deputado. No Brasil, os relógios marcavam 15h. Na China, eram 4h da madrugada. Ao ler o nome do colega no visor do celular, Henrique decidiu atender.

"Expliquei tudo a ele", relatou Henrique. "Depois, ainda pedi ao Mozart [Vianna, secretário-geral da Mesa da Câmara] que ligasse para o André. Ele ligou, deu as razões técnicas. Não tem mais o que fazer. Não se trata de ser simpático ou antipático com ninguém. Trata-se de respeitar a Constituição e o regimento da Câmara. Algo que, como presidente da Casa, eu tenho a obrigação de fazer."

Henrique dissolveu outra polêmica relacionada ao caso. Na semana passada, membros do Conselho de Ética disseram que uma eventual renúncia de André Vargas teria seus efeitos suspensos até que o plenário da Câmara decidisse sobre o provável pedido de cassação do seu mandato. Não é bem assim.

Na visão de Henrique, "a renúncia é um ato unilateral". Assim, disse o presidente da Câmara, "se a renúncia ocorrer, eu acatarei. E convocarei o suplente imediatamente." Por quê? "Nao faz sentido ele renunciar, me encaminhar a renúncia e eu engavetar o documento. Se eu fizesse isso, teríamos um renunicado que não renunciou, o que não é admissível."

"O nome do André Vargas permaneceria no painel", prosseguiiu Henrique. "Se quisesse, ele poderia continuar votando. E qualquer pessoa poderia questionar na Justiça o resultado de uma votação que tivesse a participação de um deputado que já renunciou. Insisto: não tem lógica. Se renunciar, o processo prossegue normalmente. Mas o suplente será convocado."

Quando acordo o presidente da Câmara em plena madrugada chinesa, André Vargas já havia comunicado à imprensa e ao presidente do PT, Rui Falcão, que renunciaria ao mandato. Deu meia-volta ao constatar que a fuga, por tardia, não o livraria do julgmento no plenário. Incomodados com os respingos da sangria do filiado ilustre na já combalida imagem do PT, dirigentes petistas ainda pressionam Vargas para que renuncie.

Na conversa telefônica com Henrique, André Vargas repisou a tecla segundo a qual o único erro que cometeu foi o de realizar uma viagem de férias com a família num jato alugado pelo doleiro Alberto Yossef, preso na Operação Lava Jato. Disse que fará sua defesa no Conselho de Ética.

Ainda que fosse verdade, a situação de André Vargas não seria simples. O aluguel do Learjet 45, presente do amigo-doleiro, custou R$ 100 mil. Pilhado, Vargas disse que pagara o combustível. Desmentido pelos fatos, alegou ter recorrido a Youssef porque as passagens em voos de carreira estavam muito caras. Faltou-lhe nexo.

Para complicar, escalou a tribuna da Câmara para dizer que o favor aéreo não resultara em nenhum favor ao doleiro. De novo, os fatos se encarregaram de desdizê-lo. Mensagens de celular interceptadas pela Polícia Federal revelaram que André Vargas, então vice-presidente da Câmara, fez lobby para que o laboratório Laborgen, usado por Youssef para lavar dinheiro, obtivesse um contrato milionário no Ministério da Saúde.

Nesta semana, outro deputado enroscado com o doleiro preso sera levado ao Conselho de Ética da Câmara. Chama-se Luiz Argôlo (SDD-BA). Ele também trocou mensagens com Youssef. Apalpadas pela PF, revelaram indícios de um relacionamento monetário. Envolve até a entrega de dinheiro em domicílio, no apartamento functional da Câmara. Conforme noticiado aqui, os partidos que representaram contra André Vargas planejam fazer o mesmo com Argôlo.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.