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Josias de Souza

Com Toffoli, atraso e obscuridade presidem TSE

Josias de Souza

16/05/2014 19h41

Na sua primeira entrevista como presidência do TSE, o ministro Dias Toffoli revelou-se um personagem duro de roer. Ao defender a imposição de limites à atuação do Ministério Público na apuração de crimes eleitorais, o doutor homenageou o atraso. Ao advogar a adoção do sigilo nos processos de cassação de políticos, associou-se à obscuridade. Nos dois casos, Toffoli distanciou-se dos interesses da sociedade que lhe paga o salário no final do mês.

Suponha que você acredita que a política no Brasil pode virar, vai virar, tem que virar uma atividade menos indecente. Finja que a decência chegará agora, na eleição de 2014. Simule otimismo. Faça cara de quem acredita com toda força. Convença-se de que nada pode dar errado. Agora pense no que defende o Toffoli: limites à investigação e processos sigilosos. Desanimou, certo? Pois é!

Toffoli foi o relator da resolução do TSE que proibiu procuradores de investigar crimes eleitorais sem autorização de um juiz eleitoral. Rezam a Constituição e o Código de Processo Penal que tanto o Ministério Público como o Judiciário podem requerer a instauração de inquérito à Polícia Federal. Mas Toffoli acha que, no ramo eleitoral, nada pode ser feito sem que um juiz autorize.

Levada a voto no ano passado, a resolução de Toffoli prevaleceu no TSE com um mísero voto em contrário: o do ministro Marco Aurélio Mello. Em recurso ao STF, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pede a revogação da novidade. O recurso será julgado na semana que vem. Agora responda rápido: se a compra de votos e o caixa dois proliferam a despeito da atuação da PF e da Procuradoria, o que será da moralidade se for mantida resolução que empata a investigação?

Ao defender o sigilo na tramitação das ações de impugnação de mandatos de políticos suspeitos de ilegalidades, Toffoli esgrimiu uma tese inusitada. "Isso não é para proteger [o candidato]", diz ele. "É para proteger o cidadão, o eleitor." Heimmmm?!?!? "O que ocorre, na prática, é que uma prefeitura que está com o seu prefeito em vias de ser cassado ou o Estado com o seu governador, cria-se uma instabilidade administrativa de gestão." Hã, hã…

O que o novo presidente do TSE afirmou, com outas palavras, foi mais ou menos o seguinte: se o prefeito ou o governador cometeram alguma picaretagem e podem ter o mandato cassado, o eleitor sofrerá menos se não souber. Ou, por outra: é melhor o sujeito conviver com a mentira do que ser atemorizado pela verdade que o espera.

Mas, calma, não desanime. Se um dia a tese de Toffoli vingar, a perspectiva será muito boa, extraordinária. Considerando-se o ritmo da Justiça, um picareta pode concluir o mandato sem que você seja arrancado do confortável refúgio da ignorância.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.