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Josias de Souza

Temer: PMDB exige mais espaço após reeleição

Josias de Souza

10/06/2014 05h27

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Num mundo em que nada parece certo, o vice-presidente da República Michel Temer foi dormir na véspera da convenção nacional do PMDB munido de duas certezas que valem como um barbitúrico irresistível. Estava convencido de que seu partido renovaria, nesta terça-feira, a aliança que o une ao PT. E vaticinava: "Eu devo registrar que, certa e seguramente, num próximo mandato, a presença do PMDB no governo será muito mais acentuada."

Temer recebeu o blog no seu gabinete, no edifício anexo do Palácio do Planalto. Em entrevista de pouco mais de uma hora, cujos trechos mais relevantes estão disponíveis nos vídeos acima, Temer declarou que a reedição da aliança, com sua recondução ao posto de segundo na chapa de Dilma Rousseff, pressupõe uma repactuação das relações do PMDB com o governo. Algo que levará o partido a obter, num eventual segundo mandato de Dilma, ministérios que lhe foram sonegados na gestão que se encerra no final do ano.

Nas palavras de Temer, "o PMDB tem tido uma participação" no governo. Noves fora os cargos de segundo escalão e as posições em estatais, o partido comanda cinco ministérios. "Mas evidentemente que é preciso expressar melhor esta participação", afirma o vice-presidente. "E expressá-la significa ter uma ocupação maior nos espaços das chamadas políticas públicas do governo."

Ele ofereceu uma ideia dos ministérios que seu partido deve reivindicar num eventual novo governo de Dilma. "Você veja que o PMDB se queixa de não ter uma atuação em área sociais —tipo Saúde, Educação, Integração Nacional e por aí afora." Isso é mero desejo ou já está negociado? "Isso já está nas minhas convicções. Se eu for reeleito vice-presidente da República, juntamente com a presidente Dilma, eu estarei a exigir, naturalmente mediante diálogo, exatamente isso que o PMDB deseja."

Para que o PMDB obtenha os "espaços" que almeja, outra legenda terá de desocupar as poltronas. O repórter perguntou a Temer se o PT, hoje o partido mais aquinhoado da Esplanada, cederá parte de suas posições. E ele: "Não será exatamente uma cessão, mas uma compreensão. Acho que haverá compreensão. Isso tudo é fruto do diálogo. Nós do PMDB temos, e eu penso que tenho especialmente, uma capacidade muito grande de dialogar. E nesse diálogo é que nós vamos ajustar os ponteiros com o governo." Dilma já está convencida? "Seguramente, não tenho a menor dúvida disso."


Temer diz não recear a potencialização da pecha de fisiologismo que persegue o seu partido. Por quê? "O PMDB não é simplesmente um aliado, é governo." Nessa condição, disse ele, a ocupação de cargos "não será uma troca política, será uma atuação conjunta de dois partidos que chegaram ao poder e vão governar o país." Portanto, acredita o vice-presidente, não faria sentido "falar-se em fisiologismo." Ele associa as críticas ao atual modelo a "um problema maior", que decorre do "número imenso de partidos que temos no país". Algo que impõe ao próximo governo e à próxima legislatura a realização de uma reforma política.

Não acha que as críticas decorrem da reiteração dos escândalos de corrupção? "Isso só é detectável porque nós vivemos numa democracia plena", contemporizou Temer. "É um governo transparente." Otimista, o vice-presidente avalia que o país está "passando por uma fase de transição." Hoje, disse ele, "a imprensa denuncia, as pessoas denunciam… E os fatos são apurados." Disso resultará, na visão de Temer, uma depuração moral nque alcançará o Executivo, o Legislativo e o Judiciário.

Num instante em que a Petrobras encontra-se pendurada nas manchetes de ponta-cabeça, crivada de denúncias, Temer defende o "direito" dos políticos de fazer indicações para cargos nas estatais. "Aqui e em outros países, quem está na atividade política tem o direito de fazer indicações. Você pega o corpo funcional de empresas públicas, autarquias, sociedades de economia mista… é um numero infindável no nosso país. Eu duvido que um presidente, por si só, tivesse nomes suficientes para cobrir todos os setores da administração. Então, o que se faz no Executivo é receber sugestões. O que é importante registrar é que, quando há malfeitos, eles são detectados, apurados e, se for o caso, punidos."

Instado a comentar o elevado índice de eleitores que desejam mudanças no poder federal —74% do eleitorado, segundo o último Datafolha— Temer esforçou-se para suavizar o fenômeno. Sustentou que o anseio por mudanças não se confunde com a vontade de trocar Dilma por outro candidato. "Quando se fala em mudança, o que se quer é, muitas vezes, mudar para melhorar, mas não é mudar exatamente as pessoas. Se fosse para mudar as pessoas, a pesquisa não teria dado, ainda, o nome da presidenta em primerio lugar." De resto, disse Temer, "teria subido acentuadamente o potencial eleitoral dos demais candidatos, o que não aconteceu."

Temer tampouco revelou preocupação com a erosão que consome a taxa de intenção de votos atribuída a Dilma. No último Datafolha, ela caiu de 37% para 34%. A aprovação do governo desceu a 33%. O vice-presidente afirmou que "as flutuações são mais do que naturais". Acha que, "quando começar a propaganda eleitoral, o governo Dilma terá muita coisa a apresentar." Com isso, ele acredita, "a tendência é voltar a crescer o índice de aprovação e o índice eleitoral da presidente Dilma."

O PIB estagnado e a inflação acima dos 6% no acumulado dos últimos 12 meses não contribuem para a deterioração do prestígio de Dilma? "A pregação e a divulgação exagerada desses fatos eu acho que tem influência", declarou Temer. Porém, ele acredita que as pessoas se darão conta de que "o PIB do Brasil não é destoante do PIB de outros países". E a inflação, a despeito do "alarde", se mantém abaixo dos 6,5%, teto da meta oficial do governo. Mencionou, de resto, o fato de o brasileiro desfrutar de um ambiente de "pleno emprego."

Temer declarou-se "radicalmente contra" a proposta do PT de realizar uma Constituinte exclusiva para aprovar uma reforma política. Declarou que o PMDB se opõe também à proposta petista de instituir no país mecanismos de controle social da mídia. "Queremos manter o atual status constitucional da liberdade de informação. Não acho que se deva alterar aquilo que está previsto na Constituição. Se, de um lado, ela garante a livre expressão, especialmente da imprensa, por outro lado, ela adota também o princípio da responsabilidade. Você tem o direito de reposta previsto na Constituição, tem indenização por dano à imagem, dano moral e dano material. O esquema constitucionalmente previsto é muito adequado."

O repórter perguntou a Temer o que achou do discurso do medo adotado pelo PT para associar o presidenciável tucano Aécio Neves à ideia de retrocesso nas conquistas sociais. O entrevistado disse descrer da eficácia eleitoral desse tipo de tática. "É um discurso já recorrente. Não creio que o eleitor se influencie por esse fato." E quanto à pregação do candidato Eduardo Campos segundo a qual enviará para a oposição "velhas raposas da política", como José Sarney, caso chegue à Presidência? "É discurso eleitoreiro", afirmou Temer, antes de recobrir Sarney de elogios.

O que sucederia se o seu partido, de repente, virasse um força de oposição?, quis saber o repórter. "Se o PMDB um dia estiver na oposição, vai criar dificuldade muito grande" para o governo, disse Temer. "Haveria uma dificuldade governativa."

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.