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Josias de Souza

Discurso de Dilma sobre Petrobras é desconexo

Josias de Souza

10/08/2014 21h38

Eraldo Peres/APAvessa a entrevistas, Dilma Rousseff agora recebe a imprensa até nos finais de semana. O acirramento da disputa eleitoral destravou-lhe a língua. Neste domingo, a presidente trocou um dedo de prosa com os repórteres sobre a Petrobras. Parece aborrecida com a transferência da estatal da seção de economia para as editorias de política e de polícia.

"Se tem uma coisa que a gente tem que preservar, porque tem que ter sentido de Estado, de nação e de país é não misturar eleição com a maior empresa de petróleo do país", disse Dilma. "Isso não é correto, não mostra maturidade. Agora, utilizar qualquer factoide político para comprometer uma grande empresa e sua direção é muito perigoso."

Curioso, muito curioso, curiosíssimo. Se tem uma coisa que os governos Lula e Dilma não conseguiram preservar foi o "sentido de Estado" que deveria nortear o funcionamento da maior estatal do país. Há na Petrobras diretores patrocinados por partidos políticos. PT e PMDB não são os únicos. Fernando Collor (PTB-AL), por exemplo, também é padrinho de patrióticas nomeações.

Certos indicados já ganharam estabilidade no emprego. Protegido de Renan Calheiros (PMDB-AL), o ex-senador Sérgio Machado preside a subsidiária Transpetro desde 2003. Responda rápido: executivos carregados nos ombros por políticos prestarão contas ao padrinho ou à hierarquia da estatal? O ex-diretor Paulo Roberto Costa ajuda a responder.

Funcionário de carreira da Petrobras, Paulo Roberto foi alçado à diretoria de Abastecimento a pedido do deputado mensaleiro José Janene (PR), ex-líder do PP na Câmara. Com a morte de Janene, Paulo Roberto foi, por assim dizer, adotado por PT e PMDB. E a coisa acabou numa cadeia do Paraná.

A preocupação de Dilma com a Petrobras é um bom começo. Mais um pouco e a presidente vai acabar se dando conta de que a Polícia Federal só investiga o dinheiro que sai pelo ladrão na estatal porque os ladrões continuam entrando na Petrobras. Quando isso ficar claro, a empresa talvez retorne para a editorial de economia.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.