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Josias de Souza

Costa afirma na CPI que e-mail sobre irregularidades foi pedido por Dilma

Josias de Souza

02/12/2014 18h28

Delator do escândalo da Petrobras, o ex-diretor de Abastecimento da estatal Paulo Roberto Costa disse à CPI que não subverteu a hierarquia ao enviar e-mail, em 29 de setembro de 2009, à então ministra Dilma Rousseff. Afirmou ter atendido a um pedido da própria Casa Civil da Presidência, então chefiada por Dilma. Na mensagem, revelada pela revista Veja em sua edição de 26 de novembro passado, Costa alertou para a ameaça de interrupção de grandes obras.

Após detectar superfaturamentos por três anos consecutivos, o TCU recomendara a paralisação dos canteiros de duas refinarias —Abreu e Lima, em Pernambuco; e Getúlio Vargas, no Paraná— e de um terminal portuário —Barra do Ricaho, no Espírito Santo. Eram obras de responsabilidade da diretoria de Paulo Roberto. Resultavam, como se sabe hoje, em propinas para políticos de pelo menos três partidos: PT, PMDB e PP.

A pretexto de corrigir informações "deturpadas", Paulo Roberto Costa preocupou-se em fazer dois esclarecimentos: 1) não escreveu a Dilma por iniciativa própria; 2) seu objetivo não era o de evitar a pralisação das obras, mas "alertar" para a ocorrência de irregularidades. O resulado prático foi outro. O Congresso aprovou a recomendação do TCU, determinando a interrupção dos repasses de verbas para as obras. Mas o então presidente Lula vetou a decisão, mantendo abertos os cofres. Posteriormente, o Congresso manteve o veto. Assim, os repasses que financiavam as propinas foram mantidos.

"Esse e-mail, quando foi passado, era de conhecimento do presidente da Petrobras (José Sérgio Gabrielli)", disse o delator à CPI. "Foi-me pedido pela Casa Civil para que eu mandasse esse e-mail diretamente para a ministra da Casa Civil na época, atualmente nossa presidente Dilma." Ao afirmar que seu propósito não era o de evitar o fechamento dos canteiros de obras, Paulo Roberto fez pose: "Nessa época, eu já estava enojado desse processo todo. Então, eu não mandei esse e-mail com o objetivo de continuar esse processo. Quando eu mandei esse e-mail foi para alertar que estávamos com problemas."

O que há de relevante na mensagem que Paulo Roberto Costa enviou a Dilma é a evidência de que o governo poderia ter agido, há cinco anos, ainda sob Lula, para lacrar a usina de propinas que funcionava na Petrobras. Indicado pelo PP em 2003, o agora delator estava na diretoria de Abastecimento justamente para manter desobstruído o propinoduto. Após enviar o e-mail tratando do tema que o "enojava", Paulo Roberto se manteve no posto por mais três anos. Afastou-se apenas em 2012. Decerto comandava a diretoria de Abastecimento com o nariz tapado.

Em resposta à notícia de Veja, Dilma manifestou-se por meio de uma nota da Secretaria de Comunicação do Planalto. No texto, disponível aqui, informou ter encaminhado as suspeitas de irregularidades nas obras da Petrobras à Controladoria-Geral da União.

Anotou também que houve uma "reunião de trabalho" sobre o tema em 20 de janeiro de 2010. Participaram do encontro representantes do TCU, da Comissão de Orçamento do Congresso, da Petrobras e do Ministério de Minas e Energia. "Houve consenso sobre a viabilidade da regularização das pendências identificadas pelo TCU", diz a nota.

Trazido a Brasília para ser acareado com o ex-colega Nestor Cerveró, Paulo Roberto Costa se absteve de revelar o teor dos "80 depoimentos" que prestou sigilosamente como delator. A certa altura, questionado sobre quantos políticos delatou, o ex-diretor declarou: "algumas dezenas". Repetiu, de resto, algo que dissera em depoimento público à Justiça Federal: o esquema de propinas não se restringe à Petrobras. Ocorre em obras públicas no Brasil todo.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.