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Josias de Souza

Graça silencia sobre o u$o político da Petrobras

Josias de Souza

17/12/2014 16h20

Ainda presidente da Petrobras, Graça Foster conversou com os jornalistas nesta quarta-feira. Confirmou ter colocado o cargo à disposição de Dilma Rousseff. Conversaram sobre o tema uma, duas, talvez três vezes. "A coisa mais importante para esta diretoria é a Petrobras. É muito mais importante que o meu emprego", disse, ao lado de diretores que integram sua equipe. Durante a conversa, Graça falou sobre quase tudo. Só não tratou do essencial: o aparelhamento político da Petrobras.

Ao interrogar o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa, em 8 de outubro, o juiz Sérgio Moro perguntou ao depoente se havia algo que quisesse declarar. E ele: "Queria dizer só uma coisa, Excelência. Eu trabalhei na Petrobras 35 anos. Vinte e sete anos do meu trabalho foram trabalhos técnicos, gerenciais. E eu não tive nenhuma mácula nesses 27 anos."

Paulo Roberto prosseguiu: "Se houve erro —e houve, não é?— foi a partir da entrada minha na diretoria por envolvimento com grupos políticos, que usam a oração de São Francisco, que é dando que se recebe. Eles dizem muito isso. Então, esse envolvimento político que tem, que tinha, depois que eu saí não posso mais falar, mas que tinha em todas as diretorias da Petrobras, é uma mácula dentro da companhia…"

Durante a entrevista, Graça Foster fez referência ao depoimento de Paulo Roberto. Disse que, em março, quando o ex-diretor foi preso, os dirigentes da Petrobras tiveram de se familiarizar com o Código Penal. Além do jargão técnico, "outras palavras começaram a fazer parte do nosso dia a dia", declarou Graça. "Crime, lavagem de dinheiro, organização criminosa, peculato…"

Nadando contra a maré, a Petrobras tentou negar o inegável. "Ficávamos na espera de que não poderia ser verdade, que não era assim. Mas, em 8 de outubro [dia em que Paulo Roberto foi inquirido pelo juiz Sérgio Moro], tivemos acesso ao depoimento e à confirmação dessas palavras que a gente queria negar. Cartelização, excedente… tudo isso tomou ar de realidade, que tomou ar inequívoco."

O que disse Paulo Roberto ao juiz? Os contratos celebrados na Petrobras rendiam um pedágio político de 3%, que descia às arcas de pelo menos três legendas: PT, PMDB e PP. As mordidas começaram sob Lula. E prosseguiram na gestão Dilma. Na Petrobras há três décadas, Graça diz que não notou a roubalheira. Quem quiser que acredite. Mas ela agora já sabe: "Tudo isso tomou ar de realidade, que tomou ar inequívoco."

No depoimento que levou Graça Foster a cair em si, Paulo Roberto também disse que há corrupção na Transpetro, subsidiária naval da Petrobras. Declarou ter recebido R$ 500 mil em verbas sujas das mãos do próprio presidente da companhia, o ex-senador Sérgio Machado, afilhado político do senador Renan Calheiros (PMDB-AL).

Auditores externos da Petrobras pediram o afastamento de Sérgio Machado. O indicado de Renan tirou licença de 30 dias. O tempo passou. E as resistências dos auditores em avalizar o balanço da Petrobras aumentaram. Sérgio Machado renovou sua licença por mais um mês. Agora, o mercado cobra a saída da própria Graça Foster. "Vou continuar enquanto contar com a confiança da presidente [Dilma] e ela entender que eu deva ficar", resigna-se a suposta comandante da Petrobras.

A estatal prepara-se para divulgar ao mercado um balanço precário. "Pela primeira vez, na nossa história de 61 anos, um balanço não auditado, por conta de denúncias", lamenta Graça Foster, que se refere à situação como algo "inacreditável". Contra esse pano de fundo, espanta que a pseudo-presidente da maior estatal brasileira silencie sobre o essencial: o u$o político da Petrobras.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.