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Josias de Souza

Dilma denuncia a incompetência cometendo-a

Josias de Souza

04/02/2015 17h53

Alan Marques/FolhaDilma não pode ser entendida à luz dos conceitos clássicos da política. Há uma originalidade dramática no governo dela. A gestão Dilma é mais suicídio do que morte natural. É mais uma imolação do que um mandato. Dilma é movida por objetivos instintivos e paradoxais. Virou uma caricatura da gerente de Lula. E se autoatribuiu a missão inconsciente de desnudar a ineficiência. Dilma denuncia a incompetência cometendo-a.

Dilma fez da Petrobras seu latifúndio improdutivo. Insensível, Graça Foster não teve sensibilidade para enxergar que Dilma é uma presidente diferente. Seus antecessores enfrentavam crises provocadas por opositores. Revolucionária, Dilma fabrica a crise que ressuscita a oposição e revitaliza a democracia. Mantida no comando de uma estatal hemorrágica, Graça pediu para sair.

Demitiu-se uma, duas, três vezes. Quando o caos virou pântano, Graça deu um ultimato à presidenta. Instada a aguardar mais alguns dias, Graça decidiu socorrer Dilma, exonerando-a da obrigação de demiti-la. Foi arrastada para a exoneração por outros cinco executivos. Restou o grão-petista José Eduardo Dutra que, no usufruto de uma licença médica, absteve-se de requerer alta da Cleptobras.

Diz-se no Planalto que Dilma ficou irritada com um telefonema que recebeu de Graça na noite de terça-feira. Depois de combinar a cronograma de sua fritura, a amiga de Dilma ligou para avisar que saltaria da frigideira antes do prazo. Ora, francamente. Isso não se faz! Dilma não admite improvisos. No seu governo, o erro é fruto de minucioso planejamento.

O Brasil se preocupa com Dilma. A nação se esvai na torcida para que a presidente não fique irritada. A dieta da madame está surtindo efeito?, perguntam-se todos. O que Dilma comeu hoje? Quem Dilma mastigou ontem? O país segue os humores da presidente como novela das nove. E Graça resolveu irritá-la assim, gratuitamente, deixando a cena como um navio que abandona os ratos. Dizia-se que Graça era muito parecida com Dilma. Tolice. Faltou-lhe a grandeza da vista curta que caracteriza a amiga. Aos olhos de Dilma, Graça cometeu o erro de sair.

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Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.