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Josias de Souza

Sabesp premia grandes consumidores de água

Josias de Souza

13/02/2015 05h06

Responsável pelo abastecimento de água em São Paulo, a Sabesp mantém com 500 grandes consumidores contratos que não combinam com a atmosfera de seca, a mais severa em 84 anos. Num instante em que o governo tucano de Geraldo Alckmin prepara um rodízio e flerta com o racionamento, esses clientes são premiados pelo consumo. Quanto mais água utilizam, menos pagam.

A repórter Maria Martín obteve uma lista com 294 nomes de superclientes da Sabesp. Veiculou-a no El País. Datada de dezembro de 2014, a peça é oficial. Foi enviada pela própria Sabesp à CPI municipal que investiga os negócios da companhia com a prefeitura de São Paulo.

Constam da relação, por exemplo, condomínios de luxo, bancos, hospitais, shoppings, indústrias, supermercados, colégios, clubes de futebol, hotéis e até a Bolsa de Valores de São Paulo. Pagam pela água menos do que o valor fixado na tabela aplicada à clientela que consome menos no mesmo ramo de atividade comercial ou industrial.

O Shopping Eldorado, por exemplo, consome mensalmente algo como 20.000 m3 de água. É o suficiente para suprir as necessidades de 1.200 famílias de quatro pessoas. Para cada mil litros d'água que utiliza, paga R$ 6,27. Clientes comerciais que não assinaram contrato com a Sabesp desembolsam R$ 13,97. O desconto concedido ao shopping é de 55%.

O Hotel Hilton mantém spa e centro fitness aberto 24 horas. Outra atração é sua piscina com vista panorâmica. A hospedaria verte 11.722 m3 de água por mês. O equivalente ao consumo de 751 famílias. Paga R$ 6,76 por mil litros. De novo, bem menos que os R$ 13,97 da tabela. A fábrica de celulose Viscofan, situada no topo da lista de consumidores que foi divulgada, paga ainda menos R$ R$ 3,41.

Os 294 superconsumidores citados na lista que veio à luz firmaram os contratos com a Sabesp a partir de junho de 2010. Juntos respondem por 1,23% do total de água consumida na cidade de São Paulo. O percentual crescerá expressivamente quando forem conhecidos os 206 consumidores cujos nomes ainda permanecem em sigilo.

Antes de entregar a relação parcial à CPI, a Sabesp sonegara a lista à Agência Pública de jornalismo. A entidade recorreu ao corregedor-geral da governo de São Paulo, Gustavo Ungaro. Que determinou, no final de janeiro, a entrega do papelório. Nas palavras de Ungaro, "não há como negar interesse coletivo" que os contratos despertam —"quer por envolver a atuação de uma sociedade de economia mista quer por ter por objeto a administração de um bem público: a água."

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.