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Josias de Souza

Dilma volta à cena atirando... contra o próprio pé

Josias de Souza

20/02/2015 20h20

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Empurrada por Lula, Dilma rompeu um silêncio de 60 dias para reagir ao bombardeio que atinge o seu governo. Após uma cerimônia pública, achegou-se gostosamente aos repórteres. Saiu atirando. Mirou em Fernando Henrique Cardoso. Mas acertou o próprio pé.

"Olhando os dados que vocês mesmos divulgam nos jornais, se em 96 ou 97 tivessem investigado e tivessem naquele momento punido, nós não teríamos o caso desse funcionário da Petrobras que ficou durante quase 20 anos [beneficiando-se] de corrupção", disparou Dilma. "A impunidade, e isso eu disse durante a minha campanha, a impunidade leva água para o moinho da corrupção."

Dilma referia-se a Pedro Barusco, ex-gerente de Serviços da Petrobras. Delator premiado, ele contou aos procuradores da Operação Lava Jato que começou a receber propinas da holandesa SBM em 1997. Nessa época, governava o país FHC. Barusco também declarou em depoimento que a petrorroubalheira foi "institucionalizada" a partir de 2004, sob Lula.

Dilma feriu o próprio pé ao insinuar que, há 18 anos, FHC tinha a obrigação de saber que Barusco, à época um assaltante solitário, embolsava propinas na Petrobras. Na prática, a entrevistada admitiu que a corrupção seria bem menor no Brasil se ela e seu padrinho político não tivessem fechado os olhos para a ação da quadrilha que transformou a maior estatal do país num escândalo sem precedentes.

Líder da oposição na Câmara, o deputado tucano Bruno Araújo deu crédito a Dilma. Tomando-a ao pé da letra, concluiu: "A presidente Dilma assume publicamente que prevaricou". De fato, Dilma dá as cartas no setor petroleiro há 12 anos. Por que não agiu? Por que permitiu que seu partido, o PT, amealhasse algo como US$ 200 milhões em petropropinas, segundo estimou o mesmo Barusco?

Se essa Dilma que agora se dedica a dar entrevistas tivesse assumido o Ministério de Minas e Energia em 2003, uma das coisas que se poderiam esperar seria uma rápida investigação dos Baruscos que o tucanato abafou. Uma boa higienização da Petrobras certamente estaria na agenda de prioridades da ministra nomeada por Lula.

A corrupção é como um esporte coletivo. O sujeito pode ser um craque dos desvios, mas não vence o jogo sozinho. Há toda uma estrutura para preparar os lances —o cleptogoverno, o padrinho patrimonialista, o partido com fins lucrativos, os predadores internos, os inimigos externos… Afinal, todo o time em campo, ajeitando a jogada. O criminoso apenas comete o crime.

Se Dilma tivesse chefiado a Casa Civil de Lula, o PT, o PMDB e o PP jamais teriam enfiado Costas, Machados, Cerverós, Duques e outros truque$ nos postos de direção da Petrobras. Dilma perceberia o excesso de patriotismo do petismo e dos aliados. E tomaria todas as providências para manter a joia da coroa estatal a salvo dos piratas.

Imagine-se as mumunhas que Dilma teria abortado se, além de comandar a Casa Civil, tivesse presidido o Conselho de Administração da Petrobras. Ela jamais teria avalizado a compra superfaturada de uma refinaria tecnologicamente defasada na cidade texana de Pasadena. Certamente chamaria a Polícia Federal ao dar de cara com aquele relatório que o Cerveró redigiu em cima da perna.

Se Dilma fosse presidente da República, não teria pestanejado. No primeiro dia do mandato inaugural, teria mandato ao olho da rua os diretores desonestos. Eles não teriam usufruído da oportunidade de continuar roubando por mais um ano e meio. Seriam expurgados por justa causa. Dilma não permitiria que saíssem sob elogios do Conselho de Administração pelos "bons serviços prestados".

Os familiares de Dilma deveriam pedir, urgentemente, um teste de DNA. Não há mais dúvidas: a atual inquilina do Planalto é uma impostora. Se Dilma estivesse no comando, não atiraria contra o próprio pé dessa maneira. Dilma não forneceria munição para o tucanato. Ela não levantaria tantas bolas para FHC e Aécio Neves cortarem.

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Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.