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Josias de Souza

Asfalto se divide: chapa quente X chapa branca

Josias de Souza

14/03/2015 05h44

..Atos contra medidas do governo, mas pró-Dilma? Organizadores explicam

Dilma Rousseff dividiu o asfalto em duas faixas. Numa, promete desfilar neste domingo a rapaziada da ala chapa quente. Noutra, trafegou nesta sexta-feira a pelegada do bloco chapa branca. É grande a diferença entre os dois grupos. Um é a sociedade civil. Outro, a sociedade organizada. Um é o público. Outro, a coisa pública. Um faz pressão popular. Outro, lobby. Um é grito. Outro, resmungo. Um é explosão. Outro, flatulência.

Custeada pelo déficit público e pelo imposto sindical, a infantaria desta sexta contou com uma rica intendência —balões e faixas profissionais, bandeiras e camisetas vermelhas, carros de som, ônibus, um kit-manifestação e até  vale-protesto. Lideradas por entidades como CUT, MST e UNE, três aparelhos capturados pelo Estado petista, essas manifestações serviram para sinalizar que Dilma ainda encontra algum apoio nas ruas. Mesmo que tenha que procurar um pouco.

Dentro de poucas horas, descerá ao meio-fio a turma do ambiente virtual das redes sociais. Nas suas últimas aparições, essa gente fez roncar as praças em junho de 2013 e crispou o cenho defronte dos estádios durante a Copa. Ninguém espera para este domingo nada tão grandioso. Mas Dilma está apreensiva. Dependendo da temperatura do asfalto, o derretimento do que lhe resta de imagem será mais rápido.

Há dois anos, Dilma e Lula esgrimiram a tese segundo a qual a onda de protestos era consequência dos êxitos do poder petista. Nessa versão, as ruas exigiam mais do Estado porque os governos do PT produziram um Brasil inteiramente novo. Atendida nas suas necessidades fundamentais, a sociedade exigia mais.

Hoje, Dilma não tem o que dizer. Com o alarme da impopularidade a lhe soar nos ouvidos, tornou-se gestora de uma agenda de tópico único: consertar os erros do primeiro mandato. Dilma é movida pelo pior tipo de ilusão que pode acometer um presidente na sua situação. A ilusão de que preside. Resta-lhe rezar para que os protestos sejam mixurucas.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.