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Josias de Souza

Em três meses, Dilma mudou a cara do governo

Josias de Souza

08/04/2015 04h40

Os 62% de brasileiros que disseram ao Datafolha considerar Dilma 2ª ruim ou péssima podem estar sendo injustos com a presidente. Talvez ela visse a redução no pagamento de benefícios sociais como um dos principais problemas do país desde seus tempos de "Mãe do PAC". A providência fazia parte da sua agenda secreta. Daí a escolha do tucano Joaquim Levy para chefiar a Fazenda. Por isso as regras que reduzem o pagamento da pensão por morte, do auxílio-doença, do abono salarial e do seguro-desemprego entraram nas primeiras medidas provisórias que o segundo governo Dilma mandou para o Congresso. São medidas típicas de início de governo, quando presidentes recém-eleitos aproveitam a euforia para alardear suas prioridades.

Depois de um discurso de posse em que anunciou o novo lema do governo —'Pátria Educadora' —,quando se esperava que viessem à luz boas notícias na área educacional, coerentes com o pronunciamento reinaugural— Dilma nomeou Cid Gomes para o Ministério da Educação. Como uma coisa não combinava com a outra, deduz-se que o ex-governador cearense virou ministro apenas para disfarçar o verdadeiro intento de Dilma, que era o de desfrutar do prazer de demitir Cid Gomes e nomear para o lugar dele um acadêmico respeitado: Renato Janine Ribeiro.

Revendo-se discursos e entrevistas antigas de Dilma só de raro em raro encontram-se referências elogiosas ao PMDB —ainda assim, é preciso procurar um pouco. Portanto, são grandes as probabilidades de que o desejo de dividir o poder com o PMDB fosse um dos principais itens da agenda secreta de Dilma. Ela só entregou a coordenação política para Pepe Vargas, petista inexpressivo, para não vitaminar a tese segundo a qual tornara-se uma escrava das vontades de Lula. No fundo, não via a hora de confiar a um Eliseu Padilha ou, melhor ainda, ao próprio vice Michel Temer a articulação política do seu governo. Mesmo que jamais tenha mencionado o plano nem para o espelho.

Aos pouquinhos, Dilma vai remodelando a cara ao seu governo. Decorridos três meses do início do segundo mandato, verifica-se que a nova gestão se parece com muita coisa, menos com aquela Dilma autossuficiente do primeiro reinado. O próximo passo da presidente talvez seja mostrar para Renan Calheiros e Eduardo Cunha que a pose de oposicionista que ambos fazem é desnecessária. Primeiro porque não faz nexo exigir a redução do número de ministérios em público e brigar pela pasta do Turismo à sombra. Segundo porque Renan e Cunha logo perceberão que, na agenda secreta de Dilma, a presidência da República é da cota do PMDB.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.