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Josias de Souza

Rumor de prisão inquieta o advogado de Dirceu

Josias de Souza

17/04/2015 16h01

Contratado por José Dirceu para defendê-lo na Operação Lava Jato, o advogado Roberto Podval veiculou na web um "desabafo aflito e impotente". Sob o título "uma prisão anunciada", ele diz que recebe "de todos os amigos jornalistas" a informação de que seu cliente será preso. E sustenta que a detenção é desnecessária.

"Pelas regras atuais, pelas formas legais, tudo me leva a crer na desnecessidade desta anunciada prisão", anotou Podval em sua página no Facebook. "Torço para que o juiz Sérgio Moro —a quem tive a chance de conhecer em outra oportunidade— homem probo e bem intencionado, magistrado sério e comigo sempre correto, mantenha-se duro, mas não injusto! Mantenha-se legalista e não publicista! Faça justiça e não pratique vingança!"

Os rumores sobre a prisão de Dirceu cresceram depois que o juiz Moro ordenou o encarceramento do tesoureiro petista João Vaccari Neto. Podval fez uma analogia inusitada: "Fico imaginando que, na época em que nasci, vivíamos um período parecido. A diferença é que na ditadura todos sabiam as razões! Aqui, por mais que procure, nada encontro que justifique a cantada prisão."

No tempo da ditadura, Dirceu pegava em armas contra os militares. No livro 'Abaixo a Ditadura' (Editora Garamond, 1998), escrito em parceria com Vladmir Palmeira, o cliente do doutor Podval resumiu os sentimentos que lhe preenchiam a alma na época:

"É difícil reproduzir o que foi o espírito de 68, mas posso dizer que havia uma poderosa força simbólica impulsionando a juventude (…). O mundo parecia estar explodindo. Na política, no comportamento, nas artes, na maneira de viver e de encarar a vida, tudo precisava ser virado pelo avesso. Para nós, o movimento estudantil era um verdadeiro assalto aos céus".

Hoje, em prisão domiciliar por conta da condenação no julgamento do mensalão, Dirceu é tratado pela força-tarefa da Operação Lava Jato como suspeito de participação no assalto às arcas da Petrobras. Sua empresa de consultoria teria firmado contratos de fancaria com empreiteiras do cartel que trocava contratos por propinas na estatal.

"Tive acesso aos documentos, às contas, aos depósitos, aos contratos, a tudo", escreveu o advogado do ex-líder estudantil. "Aliás, diga-se de passagem, tudo foi exposto sem nenhum cuidado, sem qualquer preocupação com a privacidade e com os direitos a ela inerentes; afinal, para alguns José Dirceu é a personificação do mal. E eu aqui me pergunto: quem representa o bem? Quem é o grande probo?"

Como sustenta não ter farejado no papelório de Dirceu nada que justifique um novo decreto de prisão, Podval lamenta: "Falo com um par de amigos, todos mais cultos, influentes, pessoas da mídia, formadores de opinião, e tudo o que ouço é semelhante: a tal prisão é uma questão de tempo. E todos com ela concordam."

O advogado parece enxergar um quê de antipetismo na atmosfera de borrasca que volta a enredar seu cliente: os amigos "acrescentam, ainda, que Dilma deve sair e que o PT deve acabar. Tento, em vão, dialogar: a presidente foi eleita, o partido é importante para o país, os erros devem ser punidos, mas as regras precisam ser obedecidas. Porque a vida é assim: vencer é bom, e como é bom, mas aprender a perder é necessário."

"Aflito e impotente" em meio ao seu "desabafo", Podval trata as repercussões da Lava Jato como uma espécie de terceiro tempo do Fla-Flu em que se converteu a última campanha presidencial. Noutra passagem inusitada do seu texto, ele insinua que as forças derrotadas por Dilma ainda não digeriram o infortúnio.

Podval evoca uma imagem dos gramados: a tragédia do Alemanha 7 X 1 Brasil. "Lembro-me da Copa do Mundo, eu com meu filho assistindo à seleção canarinho em Belo Horizonte, no fatídico 8 de julho de 2014; em minutos, vejo o garoto desesperado, com lágrimas nos olhos, suplicando para irmos embora. Naquele momento, só uma coisa tinha a dizer: 'Não, meu filho, devemos também aprender a perder!'. "

Por sorte, o doutor definiu sua manifestação como um "desabafo". Decerto obterá nos documentos que lhe foram franqueados por Dirceu matéria-prima mais sólida para confeccionar o guarda-chuva que protegerá seu cliente do temporal que se avizinha.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.