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Josias de Souza

Encontro do PT serviu apenas para institucionalizar opção por Vaccari

Josias de Souza

14/06/2015 19h38

Ricardo Stuckert/Instituto Lula

O PT havia convocado o seu 5º Congresso Nacional para tomar algumas decisões definitivas. E o que fosse decidido definiria o que o partido seria. De certa meneira, era como se a legenda fosse escolher uma identidade ideológica entre muitas. Após mais de um ano de preparação e três dias de intensos debates, o PT, finalmente, se reposicionou. Politicamente, o partido agora se situa à direita de Lula ou à esquerda de Lula, dependendo da época.

Os grupos que coabitam o PT foram convidados a acomodar suas ideias sobre o papel. A maioria das teses propunha que Dilma devolvesse Joaquim Levy ao PSDB. No final, prevaleceu um texto sugerido pela corrente majoritária, à qual pertence Lula. Não cita o nome do ministro da Fazenda. Rosnava para ele. Mas foi retirada da peça a defesa da "alteração da política econômica".

O PT anotou apenas que deseja a "retomada do crescimento" e não abre mão da "defesa do emprego, do salário e dos demais direitos dos trabalhadores." Não está escrito, mas o partido também é a favor da cerveja gelada e do tira-gosto morninho. Defendia a volta da CPMF, mas o Levy fez cara feia. E o PT deu meia-volta.

Receoso de que uma falange peemedebista sequestre Dilma e Temer para que Eduardo Cunha possa exercer o poder sem intermediários, o PT votou um pedido de rompimento da aliança com o PMDB. O pedido foi rejeitado. Mas a militância gritou "fora Cunha", para que o inimigo saiba com quem está lidando.

Decidido a espantar a má-fama, o PT anunciara que não receberia mais doações de empresas. Abandonaria a existência superlativa dos mensalões e dos petrolões e voltaria àquela vidinha modesta que o dinheirinho dos filiados e militantes pode pagar. Mas como lero-lero não paga o fausto partidário nem as dívidas de campanha, o PT preferiu não votar esse tópico. Quer mais tempo para refletir sobre a relevância financeira do brocardo segundo o qual o dinheiro não traz felicidade.

Considerando-se todas as dúvidas e hesitações, um observador desatento poderia dizer que o Congresso do PT foi dispensável. Bobagem. O encontro serviu para o partido se solidarizar com o ex-tesoureiro João Vaccari Neto, preso no Paraná. Vaccari foi elogiado por oradores. A militância o ovacionou. Aplaudiu-o efusivamente. Chamou-o de "guerreiro do povo brasileiro". Ficou entendido que, em relação a Vaccari, o PT é 100% feito de certezas.

Digam o que disserem de Vaccari, o PT está fechado com ele. Mais que isso: assim como Dirceu, Genoino, Delúbio e João Paulo, Vaccari é o próprio PT. Para todos os efeitos, o ex-tesoureiro representa a fortuna e a miséria do partido. O PT considera que deve a ele a mesma deferência acrítica que todos costumam dedicar aos membros de uma família. São poucos, muito poucos os crimes que a solidariedade familiar não cobre.

Assim, diante de um desses momentos na vida em que precisavam tomar decisões definitivas, os petistas decidiram que o PT é Vaccari. E Vice-versa. Não se trata de uma definição qualquer.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.