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Josias de Souza

Brasília vive psicose do período ‘Pós-Odebrecht’

Josias de Souza

20/06/2015 05h44

Retido em Brasília por um compromisso na Esplanada, um senador governista ficou impressionado com a tensão exibida pelo ministro que o recebeu nesta sexta-feira (19). Resolvida a demanda paroquial que levara o parlamentar a pedir a audiência, a conversa enveredou para um tema incontornável: as novas prisões da Lava Jato. O ministro utilizou a expressão "pós-Odebrecht" como sinônimo de deterioração. Como em: "A situação vai de mal a pós-Odebrecht!"

Os riscos envolvidos na prisão de Marcelo Odebrecht seriam tão grandes que todo o estrago que a Operação Lava Jato já fez no Legislativo, no Executivo e no mercado da construção pesada virou prefácio. A política experimenta um sentimento inédito de vulnerabilidade. A oposição está preocupada. E o governo está em pânico. Quem consegue dormir bem enquanto todos perdem o sono à sua volta provavelmente está mal informado.

Em notícia veiculada em sua última edição, a revista Época relata que o presidente da Odebrecht descontrolou-se quando os policiais federais chegaram em sua casa com um mandado de prisão. Antes de ser levado, Marcelo Odebrecht teria feito três ligações. Numa delas, alcançou um amigo com credenciais para contactar Lula e Dilma Rousseff. "É para resolver essa lambança", teria mandado dizer. "Ou não haverá República na segunda-feira."

Os destinatários do recado podem até considerar adequado dialogar com o novo hóspede da carceragem da PF em Curitiba. Mas os únicos interlocutores que o mandachuva da Odebrecht terá nos próximos dias, além dos seus advogados, serão os membros da força-tarefa da Lava Jato. E já está entendido que, para esses personagens, Marcelo Odebrecht precisa de interrogatório, não de diálogo.

Emílio Odebrecht, patriarca da família que controla a maior construtora da América Latina, também teve acessos de raiva nos últimos dias, informa a notícia de Época. Seu pavio diminuía na proporção direta do crescimento dos rumores sobre a perspectiva de detenção do filho. Conforme o relato de amigos, Emílio deu para repetir uma ameaça: "Se prenderem o Marcelo, terão de arrumar mais três celas. Uma para mim, outra para o Lula e outra para a Dilma."

Ainda não sabe para onde a Lava Jato vai levar o Brasil. Mas a operação já surte efeitos extraordinários. Intima o país à reflexão. O caos já começou ou ainda não chegamos ao fundo do Pós-Odebrecht?, eis a pergunta que o brasileiro faz a si mesmo enquanto caminha para o insondável. Se a família Odebrecht cumprisse as ameaças de romper o silêncio, o país talvez eliminasse a fase do caos, caindo direto no pântano. Que é o melhor lugar para começar uma nação inteiramente nova.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.