Em notícia falsa, Planalto alardeia que governadores rejeitam impeachment
Às 23h23 da noite passada, a Presidência da República divulgou em seu blog uma ótima notícia para a inquilina do Palácio do Planalto:
"Os governadores das cinco regiões do país, que estiveram reunidos com a presidenta Dilma Rousseff, nesta quinta-feira (30), em Brasília, fizeram uma defesa clara da democracia, do Estado de Direito e da manutenção do mandato legítimo da presidenta Dilma e dos eleitos em 2014. Na ocasião, os representantes dos 27 Estados brasileiros deixaram clara sua posição de unidade em favor da estabilidade política do país."
Quem lê o texto fica com a impressão de que Dilma arrancara dos governadores que se reuniram com ela no Palácio da Alvorada, inclusive os de oposição, uma manifestação unânime contra o impeachment. O único problema é que essa notícia é falsa. A posição dos governadores sobre a higidez do mandato de Dilma não é unânime. E o tema não foi debatido no encontro dos executivos estaduais com a presidente.
A falsa notícia veiculada no blog do Planalto realça uma declaração feita pelo governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), em entrevista coletiva concedida após a reunião.
"Existe uma preocupação conjunta, em primeiro lugar, com a agenda política", disse Dino. "Primeiro, a defesa clara e inequívoca da estabilidade institucional, da ordem democrática, do Estado de Direito e contra qualquer tipo de interrupção das regras constitucionais vigentes. Portanto, defendemos a manutenção do mandato legítimo da presidenta Dilma Rousseff."
Dino tinha ao seu lado, o ministro Aloizio Mercadante (Casa Civil) e outros quatro governdores: o paraibano Ricardo Coutinho (PSB), o goiano Marconi Perillo (PSDB), o catarinense Raimundo Colombo (PSD) e o paulista Geraldo Alckmin (PSDB). Incomodado, Alckmin desdisse Dino. Negou a suposta "preocupação conjunta" dos governadores com a permanência de Dilma na poltrona. O problema é que a negativa foi omitida no texto do Planalto.
Eis o que o governador tucano de São Paulo declarou e o blog do Planalto não registrou: "Isso não foi tema da reunião nem está em discussão. Não há nenhuma discussão em relação a isso [o mandato da presidente]. Nós defendemos o quê? Investigação, investigação, investigação e cumprir a Constituição. Nosso dever é cumprir a Constituição."
Em vez de registrar a posição de Alckmin sobre o mandato presidencial, a pseudonotícia da Presidência mencionou-o noutro contexto: "Já o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, destacou a posição favorável dos governadores em relação a um dos principais temas discutidos no encontro com a presidenta: a unificação em 4% do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS)."
Nesse ponto, o texto desinforma os leitores. A alteração do ICMS foi debatida na reunião. Mas não foi "um dos principais temas". E não houve uma posição consensual dos governadores. A simpatia de Alckmin pela mudança não é endossada nem mesmo por companheiros de partido, como o goiano Marconi Perillo.
Ausente no debate do Alvorada, o tema do impeachment havia surgido numa reunião prévia. Sem a presença dos tucanos, que se encontraram na representação do governo do Paraná, os demais governadores debateram, num hotel próximo do Alvorada, os temas que tratariam com Dilma. Ali, Flávio Dino tentara convencer os colegas a divulgar uma manifestação conjunta contra o impeachment. Foi contestado pelo governado de Mato Grosso, Pedro Taques.
Em processo de rompimento com o PDT, Taques disse que não havia apenas governistas na sala. Recordou que passara pelo Senado como um senador "independente". E declarou manter a mesmo posição como governador. Acrescentou: "do mesmo modo que não nos cabe discutir a Lava Jato, um caso da polícia, do Ministério Público e da Justiça, não seria adequado tratarmos de impeachment. Isso é uma pauta para a Câmara dos Deputados." O assunto morreu.
Durante a reunião com Dilma, nem mesmo o apologista Dino se animou a mencionar o tema, só ressuscitado na entrevista coletiva que a notícia do Planalto falseou. Dilma ainda tentou empinar o tema por meio de indiretas. Como no trecho do seu discurso em que ela fez questão de recordar que seu mandato vai até 2018:
"Nós fomos eleitos na última maior mobilização democrática do país, que são as eleições. E, nessas eleições, nós assumimos compromissos perante o país e perante os nossos eleitores. E esses compromissos, expressos no plano de governo, eles dão um quadro que é o quadro que nós temos de desenvolver com todas ações, iniciativas, projetos. Enfim, realizando esse compromissos no horizonte, […] ao longo do nosso período de governo de quatro anos, portanto, até 2018."
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