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Josias de Souza

Lula fala de Dilma como se não tivesse passado

Josias de Souza

12/08/2015 06h45

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Lula realmente não sente o passar do tempo. Continua igualzinho a quando assumiu o poder federal, há quase 13 anos. Não melhorou nada. Na noite desta terça-feira, discursando para trabalhadoras rurais, em Brasília, o morubixaba do PT pediu às pessoas que não julguem Dilma Rousseff pelos seus primeiros seis meses. Recordou que o mandato tem quatro anos. Desconsiderou o primeiro mandato de sua criatura e os oito anos em que ela foi ministra.

A certa altura, Lula admitiu que ele e Dilma também estão sujeitos à condição humana: "É lógico que ela pode errar, como eu errei e como qualquer um erra enquanto mãe. Nem sempre a gente faz as coisas que são aceitas 100% pelos filhos. Nós sabemos disso. Mas quando ela errar, ela é nossa. E temos de ajudá-la a consertar. Não julguem a Dilma por seis meses de mandato, porque ele é de quatro anos."

Lula fez tais considerações no mesmo dia em que a agência de classificação de risco Moody's reduziu a nota de crédito do Brasil, deixando o país a um passo de perder o chamado grau de investimento. Há 15 dias, outra agência, a Standard & Poor's também reavaliara negativamente a nota do Brasil, prenunciando um rebaixamento que pode ocorrer no próximo ano.

Em grande medida, o estilhaçamento da confiança que a economia brasileira amealhara nas últimas duas décadas se deve à ação ruinosa de Dilma Rousseff. Madame dá as cartas na economia brasileira desde a queda de Antonio Palocci do Ministério da Fazenda, em 2006.

Dilma fez de Guido Mantega, o successor de Palocci, um fantoche. Dominou-o primeiro como chefona da Casa Civil. Depois, acumulou a pasta da Fazenda com suas funções na Presidência da República. Exagerou nos gastos públicos e descuidou do controle da inflação. Como se fosse pouco, tentou esconder a ruína fiscal que produziu sob o manto diáfano dos malabarismos contábeis.

"Nós não vivemos o momento mais extraordinário do nosso país", admitiu Lula a alturas tantas. "Vivemos um momento de dificuldades." Mas Lula parece considerar que a culpa é de algum marciano. "Não é uma dificuldade da presidenta Dilma. Não é uma dificuldade de nenhuma de vocês. É daquelas dificuldades que a gente não sabe quem criou. A única coisa que nós sabemos é que não foi o povo trabalhador que criou a crise econômica mundial."

A tentativa de atribuir a encrenca à crise internacional é ridícula. Entre as economias mais importantes do mundo, a do Brasil é a única que arrostará uma recessão. Enquanto o PIB brasileiro aponta para uma queda superior a 2%, o dos Estados Unidos deve crescer 2,5% e o da Inglaterra 2,4%, indicam as projeções do FMI. A China, que está com o pé no freio, deve crescer mais de 6,5%. A média de crescimento da economia mundial deve ficar ao redor dos 3,3%. Quer dizer: a ruína nacional é um produto doméstico.

Lula insinuou que os tucanos deveriam respeitar o resultado das urnas e descer do palanque. Na sequência, o criador de Dilma escalou o palanque. "Eu estou quieto no meu canto, mas todo dia, todo santo dia tem uma provocação. Todo santo dia, tem uma coisa. E eu estou quieto, portanto, eu queria dizer pra vocês que eu estou preparando o meu caminho para voltar a viajar por esse país." Beleza. Mas convém arrumar o que dizer. Ah, sim, seria conveniente também evitar os jatos da Air Odebrecht.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.