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Josias de Souza

Intimada a depor, Dilma repetirá: ‘Eu não sabia’

Josias de Souza

20/01/2016 19h33

Intimada a depor no processo sobre a suspeita de 'compra' de medida provisória por lobistas a serviço de empresas automotivas, Dilma Rousseff está condenada a repetir o bordão imortalizado por Lula: "Eu não sabia". Fora disso, poderia negar categoricamente o crime ou associar-se às suspeitas. Numa hipótese, correria o risco de ser desmentida pelas investigações. Noutra, deixaria em má situação o padrinho Lula, em cuja gestão as medidas provisórias teriam descido ao balcão.

Deve-se a decisão de ouvir Dilma ao juiz da 10ª Vara Federal de Brasília, Vallisney de Souza Oliveira. A presidente foi arrolada, junto com outros políticos, como testemunha de defesa de um dos acusados de 'comprar' medida provisória, o empresário Eduardo Valadão, ex-sócio de um escritório de lobby de Brasília. Lula também terá de depor. O filho dele, Luís Cláudio Lula da Silva, é investigado no caso. Recebeu R$ 2,5 milhões de outro lobista sob suspeição.

Dilma era chefe da Casa Civil quando foi editada a medida provisória supostamente comercializa. Trata de benefícios fiscais a empresas do setor automotivo. O documento passou por suas mãos a caminho do Congresso. Fez nova escala em sua mesa na volta do Legislativo, antes da sanção de Lula. Daí o intresse em ouvi-la, para arrancar dela a declaração de que nada sucedeu fora da normalidade.

Cada vez que Dilma é forçada pelas circunstâncias a mimetizar o antecessor, repisando a tecla do "eu não sabia", ela se torna uma paródia grotesca da gestora de mostruário que Lula vendeu ao eleitorado na sucessão de 2010. A supergerente deu lugar à inepcia. Em vez de eficiência, suspeição.

Da fábula petista só resta o discurso da honestidade pessoal dos presidentes, reiterado por Lula em entrevista a blogueiros nesta quarta-feira: "Se tem uma coisa de que me orgulho é que não tem nesse país uma viva alma mais honesta do que eu." Considerando-se a sucessão de escândalos, pode-se concluir que a virtude também é ficcional. Ou perdeu sua função.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.