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Josias de Souza

Lula cria epitáfio de uma era: ‘Cometemos erros’

Josias de Souza

11/02/2016 04h05

Em vídeo divulgado nas redes sociais, Lula celebrou o aniversário de 36 anos do PT. Declarou a certa altura: "É certo que cometemos erros, e quem comete erro tem que pagar." A frase tem dupla serventia. Demonstra, uma vez mais, que os petistas não enxergam no espelho desbravadores do Código Penal. De resto, ao usar o vocábulo "erro" como eufemismo para crime, Lula, hoje um personagem multi-investigado, criou sem querer o epitáfio de uma era: "Cometemos erros."

Afora a frase digna de lápide, todo o restante do vídeo tem um conteúdo auto-congratulatório. Para Lula, o PT é o partido mais importante da política brasileira. A legenda deu "vez e voz ao trabalhador" e implementou políticas sociais como nunca antes. Por essa razão, "é o partido que vive sempre enfrentando os adversários conservadores, que não aceitam o jeito petista de governar." Hummm!

O trágico, o essencial mesmo na lição do drama petista é essa ideia de que tudo foi feito com a melhor das intenções. É como se Lula se absolvesse do seu passado recente, idealizando-o. Avalia que governou com a virtude no coldre, distribuindo rajadas de perversão, pelo bem do Brasil.

Converteu o PT em máquina coletora de fundos, levou a Petrobras ao balcão, avalizou as nomeações dos petrogatunos, aliou-se a sarneys, renans, collors e malufs, achegou-se aos empreiteiros… Não protelou seus crimes, protelou apenas a culpa. Cozinheiro de omeletes, Lula não concede a si mesmo a brecha de uma dúvida ético-existencial sobre o seu direito de quebrar os ovos.

O mito petista, já um tanto gasto, tenta conservar seu fascínio enquanto a Polícia Federal, a Procuradoria e o juiz Sérgio Moro se esforçam para demonstrar que, no poder, Lula e o PT cruzaram com seus limites, romperam com esses limites e foram perdendo pelo caminho algo vital na esfera pública: o recato.

Lula estava muito preocupado fazendo a história para compreendê-la. Hoje, com a aparência cansada, virou uma paródia grotesca do heroi idílico do PT. Vendeu os ideais para financiar sua aventura. Em vez de ascetismo, a propina. Daquele sonho de 36 anos atrás só restam o espólio da conquista e o epitáfio: "Cometemos erros."

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.