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Josias de Souza

Campanha de Dilma vai à cadeia com Santana

Josias de Souza

22/02/2016 12h46

A ordem de prisão expedida pelo juiz Sérgio Moro contra o marqueteiro João Santana faz cintilar nos autos da Lava Jato uma pérola encontrada pelos investigadores no celular de Marcelo Odebrecht, preso em junho de 2015. Em mensagem endereçada a um executivo de sua empreiteira, Odebrecht anotou: "Dizer do risco cta [conta] suíça chegar na campanha dela."

O "risco" insinuado no texto de Odebrecht é óbvio: parte dos serviços de marketing prestados à campanha de Dilma Rousseff pode ter sido liquidada com dinheiro roubado da Petrobras. Mais: os recursos de origem espúria foram enviados ilegalmente para o estrangeiro. Essa combinação de fatores como que arrasta para o centro do palco a Justiça Eleitoral.

A força-tarefa da Lava Jato informa que não investiga crimes eleitorais. Ocupa-se de delitos como corrupção e lavagem de dinheiro. Nesse contexto, João Santana desce à fogueira em posição análoga à de João Vaccari Neto, o ex-tesoureiro petista. Ou seja: recebeu verba roubada da Petrobras por conta dos vínculos com o PT. O que fazia Santana para o partido? Campanhas eleitorais, entre elas a presidencial.

Correm no Tribunal Superior Eleitoral processos que, em algum momento, podem resultar na perda dos mandatos de Dilma e do vice Michel Temer. Hipótese que levaria à convocação de novas eleições. Numa das ações alega-se que a chapa presidencial deve ser cassada porque foi eleita em campanha bancada com verba suja. Os ministros do TSE farão papel de idiotas se não examinarem o tema a sério.

De acordo com os investigadores, a Operação Acarajé, como foi batizada essa nova fase da Lava Jato, está escorada numa fartura de provas documentais. Em meio aos papéis, há uma carta da mulher e sócia de João Santana, Mônica Moura, cuja prisão também foi determinada por Moro. A missiva foi endereçada a Zwi Skornicki, apontado como operador de petropropinas.

Na carta, a mulher de Santana indica duas contas bancárias. Uma aberta em Nova York. Outra, em Londres. A Polícia Federal informa que ambas estão associadas a uma terceira conta, mantida na Suíça. Junto com as contas, Mônica enviou cópia de um contrato celebrado anteriormente com offshore vinculada à Odebrecht. Deveria ser usado como modelo para as remessas do operador Zwi.

Guiando-se pelos indícios, a turma da Lava Jato identificou repasses milionários ao casal da marquetagem. Com a ajuda da Receita Federal, farejou-se até a aquisição por João Santana de um apartamento de luxo em São Paulo com verba entesourada no exterior. Sérgio Moro já determionou o bloqueio do imóvel. Servirá para ressarcir o Estado em caso de eventual condenação.

Numa entrevista que concedeu em 2013, nas pegadas do ronco do asfalto, o mago do marketing do PT disse que "os protestos não podiam ser em relação a Dilma." Nessa tentativa de interpretar a voz das ruas, Santana disse que madame estava a salvo da revolta porque seria "honesta", teria "comando" e estaria "gerindo bem" o governo.

Nessa mesma conversa, conduzida pelo repórter Luiz Maklouf Carvalho, João Santana sapecou: "A Dilma vai ganhar no primeiro turno, em 2014, porque ocorrerá uma antropofagia de anões. Eles vão se comer, lá embaixo, e ela, sobranceira, vai planar no Olimpo."

A vitória de Dilma foi apertada. Sem vocação para antropófagos, os "anões" Aécio Neves e Marina Silva aliaram-se no segundo turno. E o tucano bateu com o bico na trave. Dilma prevaleceu graças ao enredo ficcional que Santana criou na propaganda eleitoral. Junto com as urnas, abriram-se as barragens da fábula. Escorreram indicadores tóxicos: inflação, estagnação, desemprego e mais corrupção. Muita corrupção.

Já está claro que o discurso de João Santana —ela "é honesta", "tem comando" e "está gerindo bem"— virou pó. A honestidade de Dilma, responsável legal pelas arcas de sua campanha, está sub judice no TSE. Seu comando revelou-se inexistente. E sua capacidade gerencial é do tamanho da cabeça de um alfinete. Resta saber o que será feito do mandato de Dilma. A campanha vitoriosa de 2014 receberá voz de prisão junto com o marqueteiro João Santana.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.