Rua dá à crise aparência de fenômeno terminal
A margem de manobra do governo Dilma, que já era mínima, estreitou-se muito neste domingo. Estavam sobre a mesa três ingredientes explosivos: a degradação moral, a paralisia política e a asfixia econômica. Faltava à mistura uma dose de povo. Não falta mais. O novo ronco emitido pelo asfalto dà à megacrise a aparência de um fenômeno terminal. O coro de 'fora Dilma' tende a virar a trilha sonora do resto do mandato da presidente, dure o quanto durar.
Dilma discute com seus operadores políticos os termos da reação do governo. Mas não parece haver muita gente interessada em ouvir. Até os supostos aliados de Dilma no Congresso avaliam que o Planalto não tem nada de novo a dizer. A essa altura, o que se poderia esperar de Dilma é atitude. Mas desde janeiro de 2015, quando assumiu a herança indigesta que legara para si mesma no primeiro mandato, a presidente não tem conseguido oferecer senão a inação. Tudo já foi dito. E nada foi feito.
Dilma não consegue acompanhar o ritmo da crise. Seu governo revela-se intelectualmente lerdo, moralmente ligeiro e politicamente devagar, quase parando. E nenhuma dessas velocidades é compatível com a intensidade do temporal que inundou as ruas de gente revoltada com a administração petista.
Desde 2013, o principal fenômeno político do Brasil tem sido o surto de contestação social que retirou do PT e da CUT o monopólio das ruas. Num movimento iniciado em março de 2015, os alvos dos protestos tornaram-se mais nítidos. O meio-fio começou a trovejar sobre as cabeças de Dilma e de Lula. E direcionou muitos raios que os partam para o PT e seus aliados dinheiristas.
As delações e as prisões que aproximam a Lava Jato das arcas do comitê Dilma-2014, o declínio moral de Lula e a ameaça de deserção do PMDB mostram o quanto todos os ventos sopram no sentido contrário. Em política, o vento sempre sopra contra os maus timoneiros. Até os cleptoaliados do governo petista começam a cuspir no prato em que não podem mais comer.
As referências elogiosas ao juiz Sérgio Moro, reverenciado em faixas e cartazes país afora, indicam que a fome de limpeza é proporcional ao tamanho do assalto aos cofres públicos. Os manifestantes se revelam agora ainda mais atentos. Neste domingo, levaram à alça de mira personagens notórios como Eduardo Cunha e Renan Calheiros.
Até a opção eleitoral Aécio Neves e a alternativa constitucional Michel Temer, recém-mencionados na delação do ex-líder governista Delcídio Amaral, mereceram um par de menções desairosas. Uma evidência de que os revoltosos talvez não estejam dispostos a aceitar uma transição de governo que se pareça com um abracadabra para uma nova caverna de Ali-Babá.
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