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Josias de Souza

Conglomerado governista derreteu em 15 dias

Josias de Souza

14/04/2016 04h07

O número mais extraordinário do teatro da existência é aquele que a pessoa se dispõe a executar no instante em que é excluída do espetáculo. Em conversa com dez repórteres, Dilma Rousseff disse que colocará em cartaz um "pacto". Alguém indagou: se perder a batalha do impeachment aceitará participar de um pacto? Eis que, de repente, baixou em Dilma a luz que costuma brilhar quando alguém tropeça no óbvio: "Se eu perder, estou fora do baralho."

Há duas semanas, Dilma perseguia um par de objetivos estratégicos: não cair e fingir que ainda dava as cartas. Agora, já não consegue simular as aparências mínimas do poder. E reconhece que pode ter virado uma Rainha de Copas descartável. Seu conglomerado partidário derreteu em escassos 15 dias. Começou a se dissolver em 29 de fevereiro, quando o PMDB desligou-a da tomada. E se liquefez nas últimas 48 horas, depois que o pedido de impeachment foi aprovado na comissão especial que o analisava.

Primeiro, o PP declarou-se pró impechment. Na sequência, vieram o PSD e o PTB. No PR, as defecções já roçam os 60%. Nesse contexto, o anúncio do PDT de que permaneceria ao lado de Dilma serviu apenas para oferecer um parâmetro capaz de reforçar a impressão de derretimento. Nesta quinta-feira, reúne-se na Câmara a bancada do PMDB. Os correligionários de Michel Temer perseguem algo que se aproxime da unanimidade anti-Dilma.

Na entrevista que saiu pela culatra, Dilma queixou-se da imprensa. Talvez devesse considerar a hipótese de modificar seus hábitos de leitura. Ao percorrer os jornais do dia, em vez de desperdiçar o seu tempo nas editorias de política e de polícia, poderia concentrar-se na seção de empregos. Até auxiliares próximos da presidente reconhecem, sob reserva, que cresceram as chances de a presidente ser enviada para o olho da rua.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.