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Josias de Souza

Jucá no governo é uma revolução dos costumes

Josias de Souza

20/05/2016 21h17

Michel Temer iniciou pela política o ciclo de mudanças que promete implementar. O presidente interino executa uma revolução nos costumes políticos. Governos anteriores suavam para produzir os seus próprios escândalos. Temer incorpora à sua gestão, sem nenhum esforço, escândalos que já vêm prontos. Um deles, Romero Jucá, foi acomodado no Ministério do Planejamento.

Nesta sexta-feira, Jucá protagonizou uma cena inusitada. Ao lado do ministro Henrique Meirelles (Fazenda), concedeu uma entrevista sobre o rombo de R$ 170,5 bilhões detectado no orçamento da República. Discorria sobre os rigores que o governo planeja impor aos gastos públicos quando um repórter esfregou-lhe na face uma indagação sobre um dos inquéritos em que é investigado por suspeita de desviar verbas públicas.

O ministro Marco Aurélio Mello, do STF, determinara a quebra dos sigilos bancário e fiscal de Jucá no período de março de 1988 a dezembro de 2002. Nessa época, Jucá enfiou dentro do Orçamento da União emendas que destinavam verbas à prefeitura de Cantá, município de Roraima. Em troca, o prefeito superfaturava licitações e repassava parte das verbas para Jucá, acusa a Procuradoria.

"Estou muito tranquilo", disse Jucá, antes de repetir um raciocíno que adotou como bordão: "Estamos numa democracia. Qualquer servidor público, qualquer pessoa pode ser investigada. Não há nenhum demérito em ser investigado. O demérito é ser condenado. Do presidente da República ao mais simples auxiliar, qualquer um pode ser investigado."

O caso da cidade de Cantá não é isolado. Jucá responde a sete inquéritos no STF, dois referentes à Lava Jato. Um relativo à Operação Zelotes. Na véspera, o procurador-geral Janot pedira no Supremo a abertura de mais um inquérito contra Jucá e outros três senadores do PMDB: Renan Calheiros, Valdir Raupp e Jáder Barbalho. Suspeita-se que receberam propinas na obra da hidrelétrica de Belo Monte.

Como afirma Romero Jucá, "qualquer um pode ser investigado". O que espanta é a facilidade com que qualquer um vira ministro. O titular do Planejamento está na bica de virar réu no STF. Nada que preocupe o presidente interino Michel Temer, que acaba de nomear para o posto de líder do governo na Câmara o deputado André Moura (PSC-SE), réu em três ações penas por desvio de verbas públicas e investigado em outros três inquéritos —um deles por tentativa de homicídio.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.