MPF denuncia Lula, Odebrecht e mais 9 pessoas
O Ministério Público Federal protocolou nesta segunda-feira na Justiça Federal de Brasília nova denúncia contra o ex-presidente Lula, o empreiteiro Marcelo Odebrecht e outras nove pessoas. Os envolvidos são acusados dos crimes de corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro, tráfico de influência e organização criminosa. Os delitos foram praticados entre 2008, época em que Lula estava no Planalto, e 2015, quando ele já era ex-presidente. Envolvem a liberação de empréstimos do BNDES para financiar obras da Construtora Odebrecht em Angola.
Em troca dos empréstimos do banco oficial, acusa a Procuradoria, a Odebrecht realizou "repasses dissimulados" (pode me chamar de propinas) de cerca de R$ 30 milhões, em valores atualizados. A denúncia divide a participação de Lula na encrenca em duas fases. Numa, entre 2008 e 2010, ainda como presidente da República, ele foi acusado de corrupção passiva. Noutra, entre 2011 e 2015, já fora do Planalto, foi enquadrado no crime de tráfico de influência em favor da Odebrecht.
Lula responde também por lavagem de dinheiro. Segundo a denúncia, o líder máximo do PT praticou esse delito nada menos que 44 vezes. Parte da lavagem assegurou, por exemplo, os valores repassados à empresa Exergia Brasil, criada em 2009 por Taiguara Rodrigues dos Santos, sobrinho da primeira mulher de Lula. Taiguara também foi denunciado pela Procuradoria.
O Ministério Público Federal também qualificou de "indevidos" pagamentos feitos pela Odebrecht a Lula a pretexto de remunerar palestras "supostamente ministradas pelo ex-presidente a convite da construtora." Os repasses foram feitos à empresa que traz as iniciais de Lula na logomarca, a LILS Palestras. Foi criada em no alvorecer de 2011, menos de dois meses depois de Lula ter deixado a Presidência da República.
As investigações que resultaram na nova denúncia nasceram de procedimento aberto pela Procuradoria justamente para apurar a lisura das alegadas palestras de Lula. Signatários do documento entregue à Justiça, os procuradires da República Francisco Guilherme Bastos, Ivan Cláudio Marx e Luciana Loureiro Oliveira anotaram:
"Apesar de formalmente justificados os recursos recebidos a título de palestras proferidas no exterior, a suspeita, derivada inicialmente das notícias jornalísticas, era de que tais contratações e pagamentos, em verdade, prestavam-se tão somente a ocultar a real motivação da transferência de recursos da Odebrecht para o ex-Presidente Lula."
A denúncia não é atestado de culpa dos acusados. A peça pode ser recebida pela Justiça ou arquivada. Se prevalecer a primeira hipótese, sera aberta uma ação penal. Lula, Odebrecht e os outros nove envolvidos poderão exercer o direito ao contraditório, apresentando defesa, questionando as conclusões da Procuradoria e indicando testemunhas a serem ouvidas no curso do processo.
Em caso de condenação, se fossem aplicadas todas as penas sugeridas pela Procuradoria, com os respectivos agravantes, Lula seria sentenciado a pelo menos 35 anos de cadeia. É um castigo maior do que a soma das penas que os procuradores pedem que sejam impostas a Marcelo Odebrecht: 30 anos de prisão.
Vai abaixo trecho de um texto divulgado pela Procuradoria para facilitar o entendimento do caso, apurado numa operação que foi batizada pela Polícia Federal de Janus:
As investigações começaram em julho de 2015, quando o Ministério Público Federal instaurou um Procedimento Investigatório Criminal (PIC) para apurar suposta destinação de vantagens econômicas por parte da Odebrecht ao ex-presidente Lula, como contraprestação ao fato de ele ter viabilizado vários empréstimos externos. Em um primeiro momento, a apuração se concentrou no período de 2011 a 2015, com Lula já na condição de ex-mandatário do país. No entanto, posteriormente, o período foi ampliado, alcançando o ano de 2008. Outra providência adotada pelos investigadores foi a solicitação de abertura de inquérito policial, o que aconteceu em dezembro de 2015.
Por uma questão estratégica, as investigações policiais se concentraram em desvendar a forma como se deu a liberação e as circunstâncias dos empréstimos que viabilizaram a realização de obras pela Odebrecht em Angola. É que, na comparação entre 10 países beneficiados por financiamentos do BNDES, Angola foi o que celebrou o maior número de contratos no período, recebeu o maior volume de dinheiro, teve o menor percentual de juros e onde foi verificado um dos menores prazos médios de concessão dos empréstimos.
Uma vez instaurado, o inquérito policial partiu das informações e de documentos já reunidos pelo MPF no âmbito do PIC, aprofundando, em seguida, as investigações. Também chamaram a atenção dos investigadores algumas evidências levantadas pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do BNDES, como a existência de vinculações comerciais entre a Odebrecht e a empresa Exergia Brasil, de Taiguara Rodrigues dos Santos que, "embora não tivesse qualquer experiência prévia no ramo de engenharia", firmou, de forma repentina, 17 contratos para prestar serviços complexos à Odebrecht, justamente nas obras realizadas em Angola a partir do ano de 2011. Pelos supostos serviços, a empresa de Taiguara recebeu da Odebrecht, entre 2009 e 2015, R$ 20 milhões.
Na ação, os procuradores destacam que, ainda no início do esquema, foram cooptados empresários e funcionários da Exergia Portugal. Com a promessa de subcontratações, essa empresa concedeu a Taiguara, "de maneira praticamente gratuita", uma filial no Brasil. Além disso, passou a bancá-lo, antes mesmo que fosse contratado no processo de terceirização promovido pela Odebrecht. Nesse período, o "sobrinho" do ex-presidente recebeu, segundo as investigações, R$ 699 mil a título de despesas de viagens internacionais. Posteriormente, o repasse passou a ter o caráter de "pro labore", cujo valor era de US$15 mil mensais, totalizando ao menos US$ 255 mil dólares.
Provas coletadas
A análise de documentos e de materiais apreendidos na chamada Operação Janus, realizada em maio de 2016 por ordem judicial, além de vários depoimentos, permitiram aos investigadores constatar e comprovar a participação de cada um dos envolvidos no esquema criminoso. No caso do ex-presidente, lembram os procuradores da República que, além de assentir na criação da Exergia Brasil, ele "supervisionou todo o processo de captação de contratos" por Taiguara junto à Odebrecht, seja aconselhando o "sobrinho" sobre os negócios em Angola, seja apresentando-o a empresários e autoridades estrangeiras nas visitas realizadas àquele país ainda em 2010. Apenas nesse ano – último do mandado presidencial de Lula, o BNDES aprovou oito contratos em favor da Odebrecht que, juntos, somaram US$ 350 milhões. As concessões continuaram nos anos seguintes, quando a empresa firmou outros 22 contratos que chegaram a US$ 2 bilhões.
Como prova da existência e do esquema criminoso, o MPF encaminhou à Justiça documentos como e-mails trocados entre os envolvidos, fotos que registraram encontro do ex-presidente com o sobrinho e empresários em Angola, além de registros que confirmam a participação, em 2010, do então presidente em uma reunião da Diretoria de Administração do BNDES, oportunidade em que "por orientação do presidente Lula", ficou decidido que o banco público elaboraria uma agenda de ações para o período de 2011 a 2014. "Ao findar o mandato de presidente da República em dezembro de 2010, Lula deixou criadas as bases institucionais, no âmbito do BNDES, para que tivesse continuidade, nos anos seguintes, o esquema de favorecimento, mediante financiamentos internacionais, a empresas 'escolhidas' para exportação de serviços a países da África e América Latina", reitera um dos trechos do documento enviado à Justiça.
Na ação, os procuradores frisam que, pela atuação em favor da construtora, o ex-presidente aceitou, além da remuneração pelas palestras, outras vantagens indiretas que incluíram pagamentos de despesas pessoais de seu irmão José Ferreira da Silva, conhecido como Frei Chico. Como exemplos de contas que foram arcadas pelas empresas Exergia Brasil, a ação menciona mensalidades de plano de saúde e despesas com combustíveis (10 mil reais em plano de saúde, ao menos, e, pelo menos, 10 mil reais em posto de combustível). Outros indícios de que os envolvidos agiram para ocultar a origem dos recursos foi a descoberta de inúmeros saques em espécie realizados pelos funcionários da Exergia Brasil (mais de R$ 1 milhão) e pela T7Quatro (mais de R$ 160 mil), ambas de Taiguara."
Veja a lista dos denunciados e os respectivos crimes:
1) Luiz Inácio Lula da Silva – Organização criminosa, lavagem de dinheiro, tráfico de influência, corrupção passiva
2) Marcelo Bahia Odebrecht – Organização criminosa, lavagem de dinheiro, corrupção ativa
3) Taiguara Rodrigues dos Santos – Organização criminosa, lavagem de dinheiro
4) José Emmanuel de Deus Camano Ramos – Organização criminosa, lavagem de dinheiro
5) Pedro Henrique de Paula Pinto Schettino – Lavagem de dinheiro
6) Maurizio Ponde Bastianelli – Lavagem de dinheiro
7) Javier Chuman Rojas -– Lavagem de dinheiro
8) Marcus Fábio Souza Azevedo – Lavagem de dinheiro
9) Eduardo Alexandre de Athayde Badin – Lavagem de dinheiro
10) Gustavo Teixeira Belitardo – Lavagem de dinheiro
11) José Mário de Madureira Correia – Lavagem de dinheiro
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