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Josias de Souza

‘Você decide seu futuro’, diz MEC para estudantes em campanha na televisão

Josias de Souza

27/10/2016 10h31


Em meio a protestos contra a reforma do ensino médio, o Ministério da Educação levará ao ar, a partir desta sexta-feira, dois comerciais de um minuto cada. O blog obteve cópias das peças (veja acima e no rodapé). Exibem cenas que se passam no interior de uma sala de aula, ambiente que, em várias localidades, se encontra sob ocupação de alunos contrários à reforma. Quem assiste aos vídeos fica com a sensação de que os estudantes protestam contra contra si mesmos.

A lógica da reforma é resumida num bordão repetido ao final dos dois comerciais: "Agora é você quem decide o seu futuro." Num dos vídeos, uma atriz no papel de professora ensina aos seus alunos: "O novo ensino médio vai dar mais liberdade pra você escolher as áreas de conhecimento de acordo com a sua vocação ou projeto de vida. Ou ainda optar pela formação técnica, caso queira concluir o ensino e já começar a trabalhar."

Noutro vídeo, um estudante explica aos colegas: "Pois é, agora, além de aprender o conteúdo obrigatório, essencial para a formação de todos, […] eu vou ter liberdade de escolher entre quatro áreas do conhecimento pra me aprofundar. Tudo de acordo com a minha vocação e com o que eu quero pra minha vida. E pra quem prefere terminar o ensino já preparado pra começar a trabalhar poderá optar por uma formação técnica profissional, com aulas teóricas e práticas."

A "professora" pinta o cenário de terra arrasada que levou à reforma: "Vocês sabiam que a última avaliação da educação mostrou que o Brasil precisa melhorar muito o ensino médio? O desempenho dos jovens em matemática e português está menor do que há 20 anos. Duas décadas, gente! E hoje já são quase 2 milhões de jovens que nem estudam e nem trabalham." A personagem como que justifica o uso da medida provisória: "A gente precisa virar essa página. Melhorar a educação dos jovens é uma das tarefas mais importantes e urgentes no Brasil. É pra ontem!"

No vídeo estrelado pelo "estudante", ele esclarece que a reforma, esboçada pelo menos desde o governo FHC e defendida até por Dilma Rousseff na última campanha presidencial, não saiu do bolso de nenhum colete. Referindo-se à proposta de mudança no ensino médio submetida ao Congresso, declara: "…ela foi baseada nas experiências de vários países. Países que tratam a educação como prioridade."

É contra a perspectiva de assumir o controle sobre sua própria formação, selecionando com autonomia as matérias que irá cursar na fase final do ensino médio, que protestam os alunos que pegam em lanças contra a reforma. Ou por outra, esses estudantes ocupam as salas de aula em favor da manutenção do velho modelo, uma jabuticaba brasileira que, segundo todos os indicadores disponíveis, conduz ao desastre. Talvez devessem mudar o foco dos protestos, exigindo do governo mais clareza sobre a forma e os meios que serão utilizados para converter a reforma de comerciais de tevê em realidade.

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.