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Josias de Souza

Governo reage à moda do Brasil pré-Lava Jato

Josias de Souza

21/11/2016 18h56

Beto Barata/PR

Michel Temer decidiu manter o ministro Geddel Vieira Lima no cargo de coordenador político do governo. Avaliou que a denúncia contra o amigo e auxiliar não justifica a demissão. Beleza. É uma forma de ver as coisas. Mas a decisão de Temer terá um custo político. O presidente poderia ter tentado reduzir o prejuízo. Mas adotou uma coreografia que pode elevar o déficit estético de sua administração.

Geddel tentou usar sua influência para levantar o embargo de um órgão federal da pasta da Cultura à construção de um prédio no qual possui um apartamento. Em nota, o Planalto informou que Temer levou em conta o fato de que "todas as decisões sob responsabilidade do Ministério da Cultura são e serão encaminhadas e tratadas estritamente por critérios técnicos, respeitados todos os marcos legais e preservada a autonomia decisória dos órgãos que o integram, tal como ocorreu no episódio de Salvador."

O que o Planalto declarou, com outras palavras, foi o seguinte: 1) a investida de Geddel não surtiu efeitos; 2) o parecer do órgão público que paralisou a obra do prédio deve prevalecer sobre o interesse privado do amigo do presidente. E a plateia pergunta aos seus botões: por que diabos Temer não declara, sem meias palavras, que desaprovou o comportamento do seu ministro? Por que Geddel não desperdiça dez minutos do seu tempo para admitir que talvez, quem sabe, pode ter agido de forma, digamos, inadequada?

O governo Michel Temer reage aos acontecimentos como se ainda vivesse na era pré-Lava Jato. A sociedade informa, desde a célebre jornada de manifestações de junho de 2013, que o Brasil deixou de ser aquele velho gigante adormecido. Hoje, o país sofre de insônia permanente. O brasileiro está cada vez mais impaciente com tudo o que os ocupantes do poder continuam considerando "normal".

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.