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Josias de Souza

Centrão sequestrou o governo de Michel Temer

Josias de Souza

09/12/2016 04h05

Sob Michel Temer, criou-se um novo padrão de fritura de ministros. O presidente negocia com o partido. Depois, sonda o felizardo. Na sequência, joga o nome no micro-ondas, vazando-o para a imprensa. Se passar do ponto, não vai para o Diário Oficial. Escolhido para a pasta que cuida da coordenação política, o deputado tucano Antonio Imbassahy foi tostado entre o final da manhã e o meio da noite de quinta-feira (8). Está prestes a entrar para a história como o primeiro caso de ex-ministro a ser exoneradio antes da nomeação.

Temer começou a flertar com o inusitado quando Renan Calheiros lhe sugeriu aumentar de três para quatro a cota de ministérios do PSDB. Sob crise permanente, o governo precisava converter o tucanato de inimigo cordial em amigo de infância. Lero vai, lero vem, os tucanos cresceram o olho na direção do Planejamento. Henrique Meirelles, o czar da Fazenda, levou o pé à porta. Não admite uma segunda palmeira no gramado. Desceu ao balcão, então, a coordenação política, disponível desde a queda de Geddel Vieira Lima, no mês passado.

O PMDB, que se considerava herdeiro da vaga do peemedebista Geddel, fez cara feia para Imbassahy. Mas partiu do centrão —aglomerado partidário que reúne PSD, PP, PR e PTB— a reação mais enérgica. Apinhado de órfãos de Eduardo Cunha, o grupo enxergou na ascensão de Imbassahy uma esperteza de Temer para retirar o tucano do caminho do 'demo' Rodrigo Maia, pavimentando sua reeleição à presidência da Câmara.

"É amadorismo", espetou Jovair Arantes, líder do PTB e candidato ao comando da Câmara ou a um ministério qualquer. "Pelo compromisso que o presidente tem com o diálogo, ele informaria à sua base", estranhou Rogério Rosso, líder do PSD e também candidato à poltrona de Rodrigo Maia.

Temer apressou-se em chamar os líderes do centrão para uma conversa. E a nomeação de Imbassahy, vendida pela manhã como coisa decidida, subiu no telhado à noite. Se tiver de voltar à mesa de negociação, o PSDB vai acabar reivindicando a poltrona de presidente da República. Renan Calheiros terá de avisar: "Esse cargo não é possível." O tucanato indagará: "Por quê?" E Renan: "Tecnicamente, a Presidência da República não é ministério. E o Michel Temer, que eu imaginava ser da minha cota pessoal, foi sequestrado pelo centrão."

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.