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Josias de Souza

Miguel Reale, coautor do pedido de impeachment, critica Michel Temer

Josias de Souza

19/12/2016 12h45

O advogado Miguel Reale Júnior, um dos signatários do pedido de impeachment de Dilma Rousseff, avalia que Michel Temer erra ao adiar a troca de ministros para fevereiro. "Já deveria ter feito", disse, em entrevista ao jornal Valor. Reale acha que o presidente "teve visão muito brasiliense do país, de formar maioria no Congresso, do conchavo congressual, com grupos ligados ao passado."

"Temer ficou muito encastelado em Brasília por muito tempo e está faltando esse olhar para a sociedade", declarou o advogado. Para ele, o presidente precisaria "abrir-se e falar para o povo." Mas falta-lhe "estratégia de comunicação." Reale também afirmou que Temer está cercado de pessoas com um passado "envolto em corrupção".

A despeito da avaliação ácida, Reale sustenta que "a situação estaria muito pior" sem o impeachment. Por quê? "Medidas muito difíceis foram adotadas, que não teriam sido implementadas, a começar pela PEC do teto. Foi um ponto de partida necessário para estabelecer a confiança de agentes econômicos e de investidores estrangeiros. O problema é que a classe política e a estrutura são as mesmas. Não houve nem poderia haver uma efetiva alteração."

Reale enxerga paradoxos no governo: "Temer teve a coragem de apresentar uma proposta de reforma previdenciária profunda, que vai enfrentar resistências. Ao mesmo tempo ele tem uma 'entourage' ligada a um passado viciado, de pessoas envolvidas na corrupção do mensalão, do petrolão."

Ele acrescenta: "Mas temos que pensar que se não houvesse o impeachment, não haveria os quatro processos contra Lula. Se Dilma tivesse permanecido, Lula seria ministro e estaria fazendo manobras, aliado a Renan Calheiros. Renan continuaria com sua audácia." Absteve-se de recordar que, hoje, Renan exerce sua "audácia" de mãos dados com Temer.

Ex-ministro de Fernando Henrique Cardoso, filiado ao PSDB, Reale rejeita propostas como a do senador Ronaldo Caiado, que defende a renúncia de Temer, e do ex-petista Helio Bicudo, também signatário do impeachment, que prega o impeachment do substituto constitucional de Dilma.

"Precisamos de um presidente, passar esse momento. Seria loucura colocar o país numa insegurança absoluta nesse instante", declara Reale. Ele descrê da hipótese de Temer ser afastado em decorrência do processo que pede no TSE a cassação da chapa Dilma-Temer.

"Vai demorar. Tem provas a serem produzidas, perícias a serem realizadas, delação da Odebrecht, tem muita coisa pela frente. A decisão do TSE tem recurso para o Supremo. Não se completa no ano que vem." Reale posiciona-se a favor da separação das contas de campanha de Dilma e Temer. "A chapa é única, mas as contas são separadas."

Reale defende o aumento da taxa de participação do tucanato no governo Temer: "Tem que ter papel fundamental, de garantir que essa pinguela se transforme numa ponte mais segura. É um jogo arriscado, mas o que fazer? Se o governo fracassar, será sócio do fracasso."

Sobre o autor

Josias de Souza é jornalista desde 1984. Nasceu na cidade de São Paulo, em 1961. Trabalhou por 25 anos na ''Folha de S.Paulo'' (repórter, diretor da Sucursal de Brasília, Secretário de Redação e articulista). É coautor do livro ''A História Real'' (Editora Ática, 1994), que revela bastidores da elaboração do Plano Real e da primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso à Presidência da República. Em 2011, ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo (Regional Sudeste) com a série de reportagens batizada de ''Os Papéis Secretos do Exército''.

Sobre o blog

A diferença entre a política e a politicagem, a distância entre o governo e o ato de governar, o contraste entre o que eles dizem e o que você precisa saber, o paradoxo entre a promessa de luz e o superfaturamento do túnel. Tudo isso com a sua opinião na caixa de comentários.