Para Michel Temer, governo merece congratulações pelo muito que já fez
Michel Temer está chateado. Acha que seu governo não vem obtendo o reconhecimento que merece. Um auxiliar do presidente conta que ele se considera injustiçado pelo pedaço da imprensa que o imprensa. Herdou de Dilma o caos, gosta de realçar. Poderia resignar-se. Mas prefere encarar a conjuntura com coragem, não cansa de repetir. Enumera os feitos obtidos em escassos sete meses: a PEC do teto dos gastos, a troca do modelo de exploração do pré-sal, a deflagração da reforma do ensino médio, o encaminhamento da proposta de ajustes na Previdência. Temer está satisfeito consigo mesmo. Lamenta que os resultados não aparecem do dia para a noite. Mas avalia que todos têm o dever de reconhecer que as coisas melhoraram.
Num instante em que perde a pouquíssima popularidade de que dispunha, Temer cogita enfrentar as panelas no horário nobre da tevê, para demonstrar à plateia que seu governo é entusiasmante. Muitos brasileiros, depois de ouvir o pronunciamento do presidente talvez resolvam viver no país que ele descreve com tanta convicção, seja ele onde for. No país de Temer, pelo menos, o presidente não é alvejado por denúncias, seus auxiliares não são suspeitos de corrupção, seus líderes no Congresso não respondem a inquéritos, sua base legislativa não está apodrecida, seu partido não cheira mal, não existe Odebrecht, as ruas não roncam e 2017 será próspero.
Temer faz como o avestruz: para não tomar conhecimento do pedaço cinza da realidade, enfia a cabeça nos seus autocritérios. O brasileiro vive um daqueles momentos em que entender o que se passa depende da predisposição de cada um. Ou o país continua na rota do caos ou tomou a trilha da redenção, você decide. Temer é otimista por obrigação. Sua claque é otimista por hipnose. Seus aliados são otimistas por intere$$e. Os 13% que avaliam seu governo como ótimo ou bom são otimistas na esperança de que as medidas do governo sejam boas, pois não há outras. E os 63% que pedem a renúncia de Temer antes do Natal desconfiam que quem é otimista trocou a razão pela comodidade de uma confiança cega.
Alçado ao Planalto nas pegadas de manifestações épicas contra a corrupção, Temer comete o erro primário de imaginar que pode governar de costas para a ética. Ao enaltecer suas realizações sem atentar para o lodo lhe toca o bico do sapato, o presidente está, no fundo, pedindo aos brasileiros que façam como ele: se finjam de bobos pelo bem do Brasil. Temer sabe que a delação coletiva da Odebrechet, trancada na sala-cofre do Supremo Tribunal Federal, transforma sua administração numa superestrutura pendurada no ar. Mas não convém comprometer a salvação do país por algo tão politicamente supérfluo como a moralidade. Enquanto der, o melhor é fingir que nada aconteceu. Fica combinado que os 800 depoimentos dos 77 delatores da Odebrecht não existem.
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